segunda-feira, 19 de agosto de 2019

O POVO DE OLHOS NA JUSTIÇA
Tendo em consideração ao Poder Judiciário, um dos três poderes do Estado moderno, disse José Mário Vaz em entrevista concedida a jornalista Isabel Marisa Serafim da Lusa e à RTP, no dia 8 de Julho de 2019, a propósito do paradeiro de 12 milhões de dólares doados por Angola: “Estamos no melhor momento para o Ministério Público averiguar essa situação, porque os protagonistas estão todos no país. Estou eu, está a ex-secretária de Estado do Orçamento e Assuntos Fiscais, está o ex-secretário de Estado do Tesouro, está o ex-primeiro-ministro e está a filha do ex-primeiro-ministro”.

Esta declaração, não sendo só um apelo à justiça, é, na minha opinião, reveladora do carácter modesto da pessoa do actual Presidente da República, ao ponto de o levar a voluntariar-se no sentido de se abdicar da capa da imunidade reforçada de que gozar como Presidente da República, para prestar esclarecimentos no âmbito do processo do desaparecimento dos 12 milhões de dólares doados por Angola, conformando-se, inclusivamente, com o facto de poder ser convocado a depor como testemunha, ser notificado, ser brigado a prestar depoimento nas formas prevista na lei, ou até constituído arguido.

O guineense de cerca de 40 anos de idade não conheceu um Ministério Público agudo quanto a aplicação e o cumprimento das leis. A Magistratura judicial continua entorpecida face aos crimes praticados pelas figuras proeminentes citadas e não citadas pelo Presidente da República, no exercício das suas funções, como o potencial envolvimento (autoria moral e material), por exemplo, nos assassinatos ocorridos nos últimos anos, entre 2009 a 2012; em desvios de fundos, uso inapropriado de bens públicos, abuso de poder, entre outros. Se a ex-secretária de Estado do Orçamento e Assuntos Fiscais, o ex-secretário de Estado do Tesouro, o ex-primeiro-ministro e a filha do ex-primeiro-ministro, não gozam, nesse momento, de qualquer imunidade especial pelos actos que praticaram no exercício das suas funções, o estará a impedir a sua convocação pelo MP?

A maior parte dos crimes cometidos nos últimos anos são do conhecimento público. Quer o processo de desvio de 12 milhões de dólares doados por Angola, quer em todos os outros que envolvem figuras cimeiras do Estado, o nome de Carlos Gomes Júnior como mandante, concordante ou consciente dos actos surge em permanência. Ele próprio desvaloriza a justiça guineense. Ele próprio na sequência do Golpe de Estado de 2012, mandou impor sanções a 11 altas patentes militares guineenses. E será que Cadogo Jr., por exemplo, não cometeu nenhum crime quando a todo custo quis - à revelia da nossa Constituição - entregar o cargo de Primeiro-ministro, para se candidatar ao lugar de Presidente da República, como forma de barrar caminho a outros candidatos? A nossa Justiça parece elitista e cínica. O Supremo Tribunal de Justiça fora, por exemplo, o órgão judicial que admitiu a candidatura de Nino Vieira às presidenciais, cinco anos após o exílio em Portugal, mas que veio a ser assassinado em pleno exercício das suas funções.