Aos nove anos, uma rapariga foi obrigada a viver maritalmente com um homem polígamo em cumprimento “dos mandamentos bíblicos” de uma seita.
Três menores de 14 anos desencadearam um processo judicial em Manica, centro de Moçambique, para contestar casamentos impostos pelos pais e lideres da organização religiosa Johan-marangue, que autoriza a poligamia e casamentos prematuros.
Aos nove anos, uma rapariga foi obrigada a viver maritalmente com um homem polígamo, com três mulheres, em cumprimento “dos mandamentos bíblicos” da seita e para legitimar a filiação do pai à igreja.
Desde 2012 ela luta na justiça conseguir desfazer a “aliança” da união, e agora tem 14 anos.
Outras duas menores, crentes da mesma seita, começaram igualmente a brigar na justiça desde 2013 para romper seus casamentos, selados após os pastores, polígamos, terem sonhado com as raparigas, e os pais obrigados a aprovar o noivado em cumprimento do regulamento da igreja.
Geralmente, o pastor da igreja Johan-marangue tem a obrigação de casar com a filha e ou esposa dos crentes, assim que sonhar com elas.
Os membros não têm o mesmo direito.
Estes são os primeiros casos que chegam à justiça em Manica, envolvendo crentes da igreja Johan-marangue e seu braço, que só agora foram tornados públicos, embora a prática de casamentos prematuros seja muito frequente entre os membros da organização, famosa por recusar a medicina convencional.
“A própria justiça não nos ajuda tanto e acaba criando alguma fraqueza por nosso lado, porque quando encaminhamos um caso e não tem desfecho satisfatório, acabamos ficando frustrados por causa desta situação”, observou Cecília Ernesto, oficial de programas na área das raparigas da organização Lemusica (Levanta Mulher e Siga o seu Caminho), que apoia as vítimas de violência sexual e doméstica em Manica.
Ernesto, que também assiste judicialmente as raparigas, assegura que a morosidade processual nos tribunais tem “condenando o futuro” delas, que além de largar a escola, são forçadas a tornarem-se mães em tenra idade e a aumentar a proporção de pobreza entre as vitimas.
“(No primeiro litigio) Aquele caso da menina de Mutinha acabou voltando (forçado para a casa do marido), ficou grávida e teve um bebe, mas como ela ainda é menor o bebé acabou perdendo a vida e até hoje esta lá”, declarou Cecília Ernesto, pedindo uma acção sinérgica da justiça para “salvar” as crianças.
Aquela organização não-governamental admite que vários outros casos estejam a acontecer nas organizações religiosas com a mesma tradição, mas que confinados entre os membros fiéis a religião.
“Fora delas houve outros dois casos em que os promotores estão em messica”, disse Cecília Ernesto, insistindo que a justiça precisa beneficiar a protecção de menores.
“Na justiça era para termos as crianças de volta (no lar do pais) e os promotores serem sancionados. É isso que nós queríamos” precisou Cecília Ernesto.
Os últimos dados divulgados pela Unicef indicam que Moçambique tem uma média nacional de 48 por cento de raparigas que se casam antes dos 18 anos e 14 por cento antes dos 15 anos de idade.
Em relação a África Austral, Moçambique situa-se em segundo lugar, apenas atrás do Malaui.
O casamento antes dos 18 anos é particularmente elevado nas províncias do Niassa e Cabo Delgado (norte) e Manica (centro).
O casamento prematuro é um dos problemas mais graves de desenvolvimento humano em Moçambique, mas ainda é largamente ignorado no âmbito dos desafios de desenvolvimento que o país persegue, requerendo por isso uma maior atenção dos decisores políticos, alerta o relátorio da UNICEF. Voz da América