domingo, 29 de novembro de 2015

Sob a benevolência da Câmara Municipal e da POP: MENDIGOS INUNDAM PASSADEIRAS AÉREAS DO MERCADO DE BANDIM COM LIXOS E IMUNDÍCIE

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REPORTAGEM: A cidade de Bissau está inundada de mendigos “gringos” que na sua maioria são provenientes da República vizinha da Guinée-Conacri. Os mendigos usam as duas passadeiras aéreas do mercado de Bandim para pedir esmola nestes últimos tempos, aproveitando-se do “vista grossa” da Câmara Municipal de Bissau e da Polícia de Ordem Pública. De acordo com a explicação dos próprios mendigos, a câmara e a polícia têm conhecimento das suas presenças nas passadeiras, mas permitem-lhes continuar no local, para pedir a esmola.

 O grupo de deficientes-mendigos pretende criar uma associação para defender os seus direitos. Até ao dia em que a nossa reportagem falou com um dos promotores daquela iniciativa, havia 40 pessoas inscritas na organização que pretende reunir apenas deficientes mendigos de nacionalidade guineense.

 
Os mendigos consideram as duas passadeiras aéreas de Bandim como o “Ninho de Ouro”, dado que o local é frequentado por pessoas que se deslocam ao mercado e que geralmente trazem de volta das compras algumas moedas que acabam por ficar com pedintes. A passadeira aérea que se encontra frente a Polícia Judiciária e próximo do portão principal daquele que é considerado o mercado mais movimentado da capital é o mais frequentado pelos mendigos, devido ao constante vai-vem de pessoas que visitam o mercado.
 
O fenómeno de mendicidade que se regista agora no país e em particular no centro da cidade de Bissau é praticado na sua maioria por cidadãos estrangeiros, com predominância dos da Guiné-Conacri. Nos últimos tempos, os cidadãos nacionais comportadoras de deficiências acabaram por adoptar a mesma prática, dado que é o meio de ganhar alguma coisa para se sobreviver.

 Para além de deficientes, nota-se igualmente outro truque na capital, praticado por cidadãos que usam supostas receitas médicas para pedir esmola, alegando que têm pacientes em estado grave e que precisam de tratamento. Essas pessoas circulam nos arredores dos hospitais, sobretudo, junto aos maiores centros hospitalares, nomeadamente o Hospital Nacional Simão Mendes e o Hospital Principal Militar “Amizade Sino-Guineense”. Às vezes descem ao centro da cidade com receitas nas mãos que acabam por ficar totalmente machucadas.

“Irmão ajuda-me a salvar o meu filho” ou “meu irmão, a minha esposa está internada no hospital e precisa de sangue. Tenho receita médica para a compra dos medicamentos” ou ainda “o meu filho fez a cirurgia, mas não tenho dinheiro e podia-me ajudar”, são as frases que se ouvem repetidamente nas imediações dos hospitais e no centro da cidade.
 
PASSADEIRA AÉREA DE BANDIM – NINHO DE OURO DE MENDIGOS E CENTRO DE IMUNDICE
 
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A passadeira aérea do mercado de Bandim é tido como o “Ninho de Ouro” dos mendigos que ali se encontram a pedir esmola todos os dias.

 A nossa reportagem descobriu que a maioria dos mendigos (homens e mulheres) com a idade compreendida entre 30 a 45 anos ou mais, são oriundos da República vizinha da Guinée-Conacri, mas alegam que são cidadãos nacionais e vieram da zona leste do país e concretamente das regiões de Gabú e Bafatá.

 As mulheres mendigas transportam crianças de três a cinco anos de idade para pedir esmola, e deixam-nas movimentarem-se na passadeira de uma forma normal como se estivessem no solo, apesar de todos os perigos que aquele local representa para as próprias crianças. O local é usado para todas as necessidade fisiológicas das crianças. Alí defecam e dormem sobre bocados de cartolina quando lhes dá uma sonecazinha.
 
A nossa reportagem viu uma mulher mendiga a preparar um saco plástico preto (kuduro) para que o seu filho, de aparentemente quatro anos de idade, possa defecar. Ao lado estavam pessoas que vendiam produtos alimentares. Quando a cachopo terminou o serviço, a mãe pegou no saco do “produto” e deitou no lixo que ali se amontoava.

 No fim a mãe continuou a pedir a esmola nas calminhas. A nossa reportagem abordou a mulher para tentar perceber razão pela qual não levou o miúdo às casas de banho do mercado. Respondeu tranquilamente que não tinha dinheiro para pagar e além disso a criança estava muito aflita e não dava para ir até a casa de banho que se encontra no interior do mercado.

 Questionado se o dinheiro que conseguiu não o permitia pagar à casa de banho, disse que não. A partir daí recusou prosseguir a conversa, alegando que não entendia o crioulo. O preço para usar a casa de banho no mercado de Bandim é seguinte: para urinar paga-se vinte e cinco (25 xof) francos cfa e para defecar paga-se cinquenta (50 xof) francos CFA.
 
Uma outra mendiga de aparentemente 40 anos de idade e que não quis identificar-se à nossa reportagem, e que se encontrava na passadeira aérea e ao lado dela estavam deitados os seus filhos numa cartolina, improvisou uma sombra com uma cartolina para proteger as crianças.

 A mulher explicou à nossa reportagem que é viúva e que não tinha como ganhar o sustento para as crianças. Acrescentou ainda que tinha quatro filhos menores de idade, e que a única forma que encontrou para garantir a sobrevivência dos seus filhos é pedir esmola.
“Viemos aqui pedir esmola e o que conseguimos aqui levamos para ajudar na nossa sobrevivência. Tenho quatro filhos, três rapazes e uma rapariga. Ainda são todos menores e não trabalho, não tenho um familiar próximo que me possa ajudar na educação dessas crianças. Isso levou-me a pedir esmola. Se eles crescerem e talvez ali poderão frequentar a escola corânica na nossa terra”, explicou a mulher com uma voz trémula.

 Questionada sobre a sua nacionalidade, respondeu que é cidadã nacional, do leste do país. Acrescentou ainda que viveu muitos anos em Bissau com o seu defunto marido, que era guarda-nocturno.
 
HÁ PESSOAS QUE USAM “CAPA” DE PEDINTE E SEM TEREM CONDIÇÕES MORAIS PARA O FAZER
 
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Um velho deficiente que pratica a mendicidade e que apresentou-se com o nome de Samba Djuba Djaló, explicou à nossa reportagem que “há pessoas que usam a ´Capa´ de pedinte e, sem realmente terem condições morais para o fazer, visto que não são portadoras de nenhuma deficiência e muito menos problemas de ordem psicológico.
 
O velho mendigo contou que é natural da Guiné-Conacri, mas chegou ao país desde 1984. Acrescentou ainda que é pai de seis filhos e todos eles nascidos em Bissau.

 No entender de Samba Djuba Djaló, os deficientes que não estejam em condições de exercer qualquer actividade que lhes possa render alguma coisa é que deveriam recorrer a prática de mendicidade para conseguir alguma coisa que os permita sobreviver.

 Reconheceu, no entanto, que se tem registado uma proliferação de mendigos a nível da capital (Bissau), sobretudo junto ao mercado de Bandim e alguns locais públicos. Contudo, confirmou a reportagem de O Democrata que a maioria de mendigos que conhece veio da Guiné-Conacri.
 
“A maioria veio durante o período da campanha de comercialização da castanha de caju. E como se sabe todos nós reconhecemos que este povo é bom e se solidariza com os pobres, por isso muitos dos meus conterrâneos procuram a Guiné-Bissau para viver e os que têm condições física e moral trabalham para ganhar a vida”, explicou Samba Djuba Djaló.
 
CÂMARA E POLÍCIA DE TRÂNSITO SABEM DA NOSSA PRESENÇA NA PASSADEIRA MAS NÃO NOS EXPULSARAM
 
Interrogado sobre a questão das mulheres mendigas que levam os filhos para passadeira aérea e os deixam dormir ali, diz que aquelas mulheres têm a noção do perigo que correm, mas “não há como fazer”.

“Esse local é tido como o ponto estratégico para pedir esmola e se consegue alguma coisa durante o dia, por isso as mulheres preferem ficar ali, apesar de todo o perigo que aquele local representa para as crianças. Os agentes da câmara municipal e a polícia de trânsito sabem da nossa presença aqui, mas não nos expulsaram e por isso, estamos tranquilos aqui”, referiu.
 
Outro mendigo ouvido pela nossa reportagem contou que estão bem na Guiné-Bissau e nem se quer são incomodados pelo Serviço da Imigração e Fronteiras. Recordou ainda que nos últimos tempos os serviços de imigração pressionou muitos estrangeiros com a questão da documentação, mas eles foram poupados.

“Estamos aqui a pedir esmola e não viemos nesta terra para roubar ou fazer mal às pessoas. Talvez é essa a razão das autoridades nos deixarem em paz”.
 
DEFICIENTES MENDIGOS PRETENDEM CRIAR ASSOCIAÇÃO PARA DEFENDER SEUS DIREITOS


 Abordamos um deficiente mendigo que diz ser originário da Guiné-Conacri e vive há muitos anos no país. Frisou que casou-se com uma cidadã guineense, da região de Gabú e têm quatro filhos.

 O deficiene em causa e que pediu anonimato disse que pratica a mendicidade que consegue sustentar a sua família graças à sua condição de pedinte, porque não está em condições físicas para exercer qualquer actividade que lhe possa render alguma coisa.

 Explicou que recorreu a passadeira aérea de Bandim, porque sentia-se incomodado pelos vendedores ambulantes e os bandidos que aterrorizam as pessoas, fazendo com que estas sintam medo de tirar dinheiro para oferecer em esmola. Por isso resolveu subir. “Entendemos que aqui é mais seguro e as pessoas podem tirar o dinheiro do bolso a vontade para nos oferecer”.
 
O nosso entrevistado revelou que criaram uma associação para defender os direitos dos mendigos deficientes. Contou neste particular que a associação contempla ainda 40 pessoas e todos são mendigos deficientes, no entanto disse esperar que o número possa aumentar.

 Assegurou que estipularam uma quota mensal de mil francos cfa, de forma a poderem angariar fundos que os permita legalizar a organização no cartório. Sustentou que são permitidos apenas os mendigos nativos da Guiné-Bissau a inscreverem-se, porque os estrangeiros mais dia menos dia deixam o país e sem comunicar, por isso não são permitidos a sua inscrição.
Senhora Fatumata Djaló, natural de Gabú, contou a O Democrata que é mãe de duas crianças gémeas, razão pela qual pratica a mendicidade para obter alguma coisa que a ajuda na sobrevivência das crianças.
 
A mendiga mostrou-se revoltada com as pessoas que usam as crianças que não são gémeos e que fazem as mesmas passar de gémeas para pedir a esmola. No entanto, pediu a intervenção das autoridades do país neste sentido a fim de acabar com aquela prática, dado que no seu entender, “falsos gémeos podem tomar sorte dos verdadeiros gémeos e como no caso dela”.
 
Djaló reconhece o perigo de levar as crianças para a passadeira aérea a fim de pedir esmola, mas alega que não têm como fazer, por isso, vão continuar a sentar no mesmo lugar sobretudo nas primeiras horas da manhã.
 
SOCIÓLOGO RESPONSABILIZA O ESTADO PELO EMPOBRECIMENTO DA POPULAÇÃO
 
A nossa reportagem contactou o sociólogo e igualmente docente da Universidade Lusófonada Guiné, Diamantino Domingos Lopes, para falar da proliferação de mendicidade no país e em particular na cidade de Bissau.
 
O sociólogo responsabilizou o Estado da Guiné-Bissau pelo empobrecimento da população, bem como pela destruturação da família. Acrescentou ainda que o Estado não conseguiu fazer o seu trabalho que é a definição de uma política coerente de gestão da vida pública e como a consequência disso é o empobrecimento da população guineense.
 
Entretanto, a nossa reportagem contactou o serviço da câmara municipal do mercado de Bandim, que alegaram não estarem autorizados para fazer qualquer tipo da declaração à imprensa.
 
Por: Redação
Foto: Marcelo Ncanha Na Ritche