Os escritores africanos são muitas vezes confrontados com «linhas vermelhas», que aparentemente não devem ser ultrapassadas. Falamos de temas, de linguagem ou do tom que devem ser torneados e que estão bem patentes no imaginário coletivo dos artistas. Isto acontece com frequência nas regiões a oeste do continente. No entanto, nos últimos tempos é possível encontrar autores que extravasam essas linhas e afirmam a sua liberdade artística para as ignorar.
A recente publicação Valentine’s Day Anthology 2015 é a prova dessa legitima transgressão. Com o selo nigeriano da editora Ankara Press, o objetivo passou por reunir alguns dos autores mais populares do continente,ao lado dos mais promissores e convidá-los a escrever sobre histórias românticas, em línguas africanas, e colocar o resultado disponível a todo o mundo. Assim foi.
Este «cocktail» literário vai muito para além da esfera artística. Para comemorar o seu lançamento, Bibi Bakare-Yusuf, o editor responsável por esta obra, explicou que o objetivo da iniciativa passava por mostrar as «nuances» da literatura romântica africana em diferentes idiomas. O editor vai mais longe e sublinha que «está na hora de quebrar algumas barreiras e estereótipos de género e procurar a diversão ao mesmo tempo com estes temas», acrescentando que se procura «dar ar fresco àquilo que são os hábitos de leitura dos cidadãos africanos».
Cabeça de cartaz desta antologia, o queniano Binyavanga Wainain tem a companhia de mais seis autores. Apesar de alguns ainda passarem despercebidos aos olhos do grande público, o currículo fala por eles, que já contam com alguns prémios e publicações internacionais. Falamos do nigeriano Chuma Nwokolo, que é também advogado e ativista no seu país, e do escritor liberiano Jande Golakai Hawa, cujo primeiro romance conseguiu tornar-se numa das grandes promessas do continente e ambicionar alguns prémios mais respeitados no meio. Ainda da Nigéria, Sarah Ladipo Manyika, autora de um romance que fez sucesso no Reino Unido em 2008, e Toni Kan, que cultivou o conto e a poesia no país com o tema da sensualidade. Da Costa do Marfim, Edwige-Renée Dro, que atraiu o interesse dos festivais internacionais através das suas publicações em revistas digitais, e por fim o jornalista nigeriano Abubakar Adam Ibrahim, que ganhou já alguns prémios, e que é reconhecido por ser um regular finalista do prestigiado prémio Caine.
A qualidade na escrita nem se coloca em causa, mas o objetivo da obra era ir mais longe, com contos que estão a quebrar a seleção de estereótipos da literatura romântica. Com uma prosa adoçada e acutilante, são esplanadas no papel histórias de amor como adultérios, amor à primeira vista ou que se desenvolvem em clubes africanos.
Com histórias puramente africanas, o contexto, as personagens e a línguas não deixam qualquer tipo de dúvidas. Outra das «linhas vermelhas» superadas pelos autores da antologia tem precisamente a ver com a língua. O livro não está apenas em inglês, tendo já sido traduzido para francês e outros idiomas usados no continente, como Pidgin, Kiswahili, Igbo, Yoruba, Hausa ou Kpelee.
A obra Valentine’s Day Anthology 2015 é, acima de tudo, uma amostra da diversidade africana, mas também do dinamismo e da criatividade dos seus autores. Está disponível gratuitamente na internet, mas o objetivo é atingir outras plataformas digitais. Fonte: Aqui