Em breves palavras, pode dizer-se que na Economia Planificada ou de Estado, a produção económica é dirigida pelo Estado e na Economia de Livre Mercado os agentes económicos agem de forma livre, com pouca ou nenhuma intervenção dos governos. Ora, qualquer das duas economias obedecem as leis. Aliás, o Estado, em qualquer circunstância, continua a jogar o papel de regulamentação e fiscalização da economia, que pode ser de forma providencial ou não. Nada se queda à-toa ou desconexa em sede das respetivas comunidades políticas. Engana-se redondamente quem confundir a livre iniciativa com a anarquia ou saque económico nos dias que correm.
O que se constata é que nos nossos países, os partidos “libertadores” nunca se “engoliram” a ideia de livre mercado e tão pouco a de abertura ao multipartidarismo. É preciso dizer-se que livre mercado é interpretado como aburguesamento da cúpula política. E quanto à abertura política, o sistema teria que se adaptar a uma lógica política em que os partidos “libertadores” continuariam a ser determinante, sem que houvesse possibilidades para alternância política. É que, para os partidos “libertadores”, ainda vigora a lógica de que “o poder” não se conquista nas urnas, mas sim com sangue. As eleições são autênticas paródias promovidas por estes regimes, “para inglês ver”!
O discurso do Presidente José Eduardo dos Santos, sobre o Estado da Nação, encaixa-se precisamente na fórmula que acabamos de referir. O presidente angolano, em defesa da elite “burguesa” em formação no seu país, esgrimiu o seguinte argumento: “ Há quem pense que o crescimento e desenvolvimento social a diferentes velocidades de vários segmentos sociais seja uma política deliberada para perpetuar a injustiça social. Não é assim. Este é apenas um fenómeno inerente a este período de transição, em que a Nação precisa de empresários e investidores privados nacionais fortes e eficientes para impulsionar a criação de mais riqueza e emprego.” Ora, a primeira questão que salta à vista é de saber quanto tempo tem e quem estabeleceu esse “período de transição” para a consolidação da “classe empresarial” forte e eficiente para o impulsionar a criação da mais riqueza em Angola? Chegou-se ao cúmulo de tecer comparação entre o tal “período de transição” e tempo das naus e das caravelas em que se faziam pilhagens e saques.
Jornal de Angola resolveu empolgar o discurso do Presidente José Eduardo dos Santos, atacando: “Para muitas organizações ocidentais, um africano rico só pode ser corrupto. Mas têm que se habituar à realidade exposta pelo Chefe de Estado, revelada no discurso do Estado da Nação. Os empresários angolanos precisam de músculo financeiro. Angola precisa de uma classe que acumule capital. De resto, todo o mundo ocidental fez isso há muitos séculos e essa é a base do sistema que hoje está implantado no mundo. Por que haveríamos de ser nós diferentes? Não há igualdade de direitos?” Acrescentando de seguida: “Angola tem os seus ricos e todos esperamos que haja cada vez mais. Os fomentadores do sistema exigiram que Angola aderisse à economia de mercado. Aí está ela| Mas quem fez essa exigência tinha uma ideia: dominarem eles o mercado angolano e mandarem na nossa economia. Enganaram-se redondamente. Os angolanos comandam a economia e dominam o mercado. O Presidente José Eduardo dos Santos neste aspeto foi lapidar: as grandes empresas multinacionais que operam em Angola registam lucros de milhares de milhões todos os anos. E mesmo assim não querem a concorrência dos empresários angolanos.”
Quem pensa assim parece fingir não entender que o mundo mudou. As questões ideológicas não são relevantes, hoje em dia, nem para o mundo, e muito menos para o povo angolano. O que preocupa de fato é a anarquia e a corrupção económica em que os dirigentes africanos se encontram embrenhados. Em Angola, detentores de altos cargos, incluindo Ministros, Deputados, Juízes, médicos, presidentes e administradores de Bancos, consultores, etc., são apanhados em esquemas de transporte de dinheiro em malas, caixas de sapatos, contentores, barcos, aviões fretados, etc. para esconder na Europa e em outras partes do globo. A burguesia, por exemplo, na Europa, era patriótica e constituiu-se saqueando outros povos no além-mar para os seus reinos e nunca o inverso. O que assistimos hoje, será o resultado da insegurança política ou um hipotético regresso ao período do mercantilismo?
A par à corrupção que assola o continente africano, o mundo inteiro está a braços com o problema do terrorismo e de branqueamento de capital. China e Russia, também estarâo no caminho da implementaçâo da Economia Livre de Mercado. E, apesar dos pesares, não se detetam por parte da sua “classe dirigente” espetáculos com dimensâo idéntica às pilhagens económicas perpetradas nos países africanos. Nâo viajam com malas de dinheiro para esconder no estrangeiro e não se conhecem notícias de que os seus filhos sejam milionários por intervençao divina.
Na China, por exemplo, o ex-dirigente Bo Xilai, filho de uma figura da revoluçao “maoista”, foi condenado em 22 de Setembro passado à prisão perpétua com privação permanente de direitos políticos por corrupção, desvio de fundos públicos no valor de mais de 600.000 euros (811 milhões de dólares) e de 2,6 milhões de euros equivalente a 3,5 milhões de dólares, e abuso de poder, entre outros no caso do assassinato do executivo britânico Neil Heywood, cometido por sua esposa, Gu Kailai, e que Bo teria tentado acobertar. A luta contra a corrupção já é tradiçâo na China. Em 1998, houve condenação do ex-prefeito de Pequim Chen Xitong e em 2008 do ex-chefe do partido em Xangai Chen Liangyu, ambos por corrupção.
Segundo o Índice de Perceção de Corrupção de 2010, publicado pela Transparência Internacional, a Rússia ocupa a 154.ª posição a nível mundial. No primeiro mandato de Vladimir Putin, o Estado desencadeou um processo crime contra o então homem mais rico da Rússia, presidente da YUKOS, Mikhail Khodorovski, ocorrido em 2003.O governo afirmou na altura que Khodorkovski estava corrompendo um grande setor da Duma para impedir mudanças no código de impostos. O caso do mafioso “Ladrâo da Lei” (Vory v Zakone) que operava em Catalunha, Espanha, extorquindo empresários do Leste da Europa, comprando crianças para serem usadas no tráfico de órgãos no mercado negro, foi capturado durante a operação Nala, iniciada em 2007. Em 6 de Novembro de 2012, Putin destituiu o ministro da Defesa, Anatoli Serdiukov, envolvido num escândalo de corrupção. Serdiukov era suspeito de, através de uma empresa sua, ter vendido ativos a empresas comerciais com uma perda de 100 milhões de dólares (78 milhões de euros).
Nos nossos países de África, é caso para dizer que o vilão virou herói!
Recorda-se que a União Europeia decidiu em 3 de julho 2007 incluir a Transportadora Aérea Angolana (TAAG) na lista negra de companhias aéreas impedidas de voar para Europa. Esta decisão implicou a suspensão de seis voos semanais da TAAG para Lisboa. Em 06 de Dezembro de 2010, com um Boeing 777 dessa mesma companhia, com 126 passageiros a bordo, e que logo depois de ter descolado do Aeroporto de Lisboa perdeu diversas peças de metal de cinco por quinze centímetros de tamanho ao longo da cidade de Almada, tendo sido obrigado a aterrar de emergência. Portanto, o que o mundo espera de África, e naturalmente de Angola, é que volte a receber permissão de “voltar ao espaço europeu” como aconteceu em 1 de Agosto de 2009, com o primeiro voo da TAAG que partiu de Luanda para Lisboa, depois de quase dois anos de ter sido banido do espaço aéreo não apenas da União Europeia como de todo o mundo.