Na Guiné-Bissau, tem-se ouvido muito falar sobre “mesa redonda” em quase toda a esfera social e política do País. Não obstante, tanto se fala, mas pouco se entende sobre o assunto. Por isso queria começar meu modesto texto fazendo uma definição conceitual do que seria uma mesa redonda.
Além do conceito histórico nas antigas civilizações, a mesa redonda é um tipo de reunião entre pessoas, em que se discute um tema ou um assunto, sobre o qual todos os participantes têm o direito de manifestar suas opiniões de forma democrática. O encontro é simbolizado por uma mesa redonda. Esse tipo de reunião também pode ter caráter decisório, na qual os membros decidem de forma democrática o destino de algo.
Agora qual seria o objetivo da Guiné-Bissau na mesa redonda dos doadores em Bruxelas? Por que precisaríamos nos deslocar até este país europeu? Primeiro vale lembrar que a Guiné é um dos países mais pobres de mundo, principalmente no que diz respeito a seu PIB (Produto Interno Bruto) que se encontra na faixa de U$$2,502. O país encontra-se, também, com devastadas infraestruturas e uma precaridade nas condições mínimas de serviços básicos como Saúde, Educação, alimentação e segurança etc.
Toda esta situação foi condicionada pelas graves e conhecidas mazelas de Guiné-Bissau. Dentre elas podemos destacar golpes, contra-golpes, levantes e insurgências, sem contar com o que já é uma prática cultural no país, a corrupção edêmica. Tudo isto fragilizou o aparelho estatal e impossibilitou qualquer tipo de progresso. O último quadro instável do governo guineense não ajudou muito a situação, permitiu mais fragilizações do Estado, aumentou a dívida nacional soberana, houve um aumento desnecessário de funcionários,que acarretou mais prejuízos ao erário público guineense. Toda esta situação crônica fez estagnar o Estado guineense, ficando este, a mercê da pobreza.
Hoje, com um novo governo de cariz popular, advindo de uma eleição justa e democrática, os guineenses voltam a sonhar com um futuro melhor. É perceptível uma forte renovação da esperança. Os discursos têm prometido muita coisa, mas apesar de ver os sinais, é bem cedo proclamar êxitos. Eu gostaria de conhecer o diploma que o país levará para Bruxelas, quais os pontos prioritários, como está o plano traçado pelo governo e objetivado para esta “caldeirada”.
Estaremos perante “os doadores internacionais”, FMI, BM e outros parceiros estratégicos. Para o desenvolvimento é fundamental que o governo apresente projetos sérios e consistentes.
Proponho, desde já, a reforma no setor da segurança e mais outros também. Por que logo segurança? Pois, quero recordar aqui as antigas recomendações de Carlos Lopes, que demonstrou que, “se não realizarmos uma reforma da segurança, todo esforço será um fracasso”.
Ora bem, o presidente já disse que só quer “dívida boa”. Reconheço a minha ignorância em relação ao fulcro de “dívida boa” a que ele se refere. Também é bom que os guineenses saibam que, a mesa redonda não vai ser a solução, ela sim poderá servir de elemento catalizador de um “começo” que poderá permitir grandes avanços, caso a verba obtida seja bem gerida e aplicada. Daí vejo a necessidade de se pensar numa justiça de qualidade e reforçar a importância do papel do Tribunal de Contas.
Espero ter usado uma linguagem bem prosaica, devido a importância do conteúdo. Entendo a expectativa dos guineenses, isto é normal. Mas para nós, guineenses, que já vivemos de promessas desde os primórdios da luta, devemos esperar o momento certo para comemorar as vitórias. É bom ter espírito de vencedor, ser confiante, mas não aconselho sermos precipitados em relação aos futuros resultados. Como falei e repito, nota-se uma boa vontade deste governo, mas pelo nosso histórico devemos ser mais cautelosos.
Ainda no quesito mesa redonda, os guineenses, de fato, devem ter desde já ter a capacidade de entender que, uma ação apenas, por mais vantajosa que seja, não resolverá grandes problemas, sobretudo quando falamos de um país como Guiné Bissau. E vale também lembrarmos que, não existe um “velho avarento” à espera da Guiné em Bruxelas para lhe oferecer dinheiro. A Europa também tem os seus velhos problemas das constantes recessões, sobretudo da zona que dependemos mais, que é a zona do euro.
Portanto, como se tem notado na sociedade guineense uma esperança bruta e gigante sobre a mesa dos doadores, em que muitas pessoas, até os mais acadêmicos e gente da opinião pública afirmam e confundem ser solução para os problemas, essa “table rond”. Mas, gostaria de recordar que uma amiga minha alemã que, está terminado seu doutorado nos E.U.A, uma vez me disse: -“ Olha, quando nos aparece uma solução fácil para uma questão complexa, devemos desconfiar e ir com calma.” Com isso quero reforçar aos Guineenses o seguinte: a mesa redonda não é a solução para Guiné-Bissau.
A solução deverá ser a capacidade que o governo terá e deverá ter para lidar e gerir tudo aquilo que lhe compete enquanto responsável para a promoção do desenvolvimento econômico, social e cultural da Guiné-Bissau. Porque temos um longo caminho a percorrer, temos uma situação de pobreza ao extremo e graves problemas de saúde materna. O nosso país é onde ainda hoje morrem mais crianças vítimas da precariedade sanitária.
Pois bem, espero ter mexido um pouco com as mentes e ter esclarecido muita gente que acha que a mesa redonda vai ser a solução. O conceito “doadores” até soa um pouco mal, ao ponto de muita gente não saber que a possível verba que, sairá deste encontro, não será de graça para Guiné Bissau, teremos que pagar, mais cedo ou mais tarde com os devidos juros.
Espero que as terras frias e ventiladas de Rubane tenham servido de um bom espaço de reflexão do executivo, liderado por Domingos Simões Pereira. Também acredito numa Guiné forte que poderá ser uma Suécia na África, como disse um dia o socialista democrata Olof Palme, ex premiê sueco responsável pelos êxitos econômicos da Suécia nos anos 60. Também tenho a esperança numa Guiné capaz de marchar com próprios pés e guiada por seus próprios ideais, como sonhava Amílcar Cabral. Desejo ao executivo, boa sorte para o dia 25 do corrente mês. Espero que a última avaliação do FMI, que nas vésperas da mesa redonda, deu nota positiva a Guiné Bissau nestes primeiros momentos do atual executivo, seja um fator a contar e uma mais valia.
Quero fechar este pequeno artigo de opinião com uma frase de Amílcar Cabral:
“Pensar para melhor agir e agir para melhor pensar”.
Por: Tamilton Gomes Teixeira,
estudante da Sociologia na UNILAB – Brasil
Fonte: odemocratagb.com