domingo, 3 de julho de 2016

Reportagem: PRODUTOS ALIMENTARES VENDIDOS A “PAREDE E MEIA” COM O LIXO NOS PRINCIPAIS MERCADOS DA CAPITAL

Imagem de peixes vendido no chão, no mercado de Caracol

As vendedeiras dos três principais mercados da capital, nomeadamente os mercados de Bandim, Caracol e da improvisada feira de Cacheu, no Bairro Mindará, vendem produtos alimentares aos consumidores ao lado do lixo expostos no chäo.
Uma equipa de repórteres do Jornal “O Democrata visitou, este fim-de-semana, os três principais mercados da capital, designadamente o mercado de Caracol, mercado de Bandim e o mercado improvisado“Feira de Cacheu”, para constatar “in loco” o funcionamento dos mesmos e as suas condições de higiene.
Nessas localidades visitadas, tudo aponta como as mais frequentadas pelos populares da cidade de Bissau, mas também são mercados com maiores problemas de higiene, o que impede que os seus utentes e as pessoas que os frequentam possam estar à vontade.
CARACOL – CONTRASTE ENTRE LIXO E PRODUTOS ALIMENTARES QUE REPRESENTAM UMA AMEAÇ A SAÚDE PÚBLICA
A equipa de reportagem entrou pelo portão que dá acesso ao mercado de Caracol por volta das oito horas e constatou um ambiente ‘extremamente saudável’ de troca de impressões entre as vendedeiras cujas mesas se encontram a lado ao lado de umas das outras. As conversas eram sobre acontecimentos que passa na praça de Bissau no dia-a-dia, incluindo o momento político vigente.
Nesse mercado pode-se encontrar diferentes produtos tais como peixe, legumes, carne, óleo alimentar, frutas, veludo entre outros, todos para o consumo. E ao lado de tudo isso vê-se o lixo amontoado por toda a parte e que muitas vezes se confunde com os produtos postos no chão para venda. Há produtos alimentares (legumes e peixes) colocados no chão sobre sacos de plástico ou tecidos africanos igualmente de poucos higiene.
Ali se pode constatar a habitual preocupaçäo de cada vendeira em desfazer-se dos seus produtos, o que implica obtençäo de mais lucros e com isso alguma coisa para a sobrevivência. No meio de tudo, isso se pode ouvir o apregoar as qualidades dos seus produtos, enquanto se inalava o cheiro horrível do lixo. Aliás, nota-se que as senhoras já se habituaram ao cheiro, isso pode – se dizer, porque nem sequer se mostravam incomodadas. Quem frequenta o mercado pela primeira vez sente-se muito mal e até pode desistir de fazer compras por razões de higiene.
Apesar desta situação de toda a falta de higiene e das condições dos produtos alimentares expostos no chão, a clientela faz as suas compras, incluindo os produtos colocados no chão, ao lado do lixo. A nossa reportagem aproximou-se do local, mas não ouviu uma vivalma questionar ou revindicar o porque de exposição dos produtos no chão, ao lado do lixo.
Numa conversa mantida com uma mulher que comprara legumes, badjiqui e candja, expostos no chão, o porquê da razão de compra de produtos expostos no chão ao lado do lixo, correndo o risco de contrair doença, a mulher simplesmente respondeu que não havia como fazer e que Deus ajudá-lá-ia a não contrair qualquer doença.
Os vendedores informaram aos repórteres de “O Democrata” de uma situação que eles mesmos consideram de “absurda”. De acordo com os mesmos, o lixo que se amontoa no centro do mercado não foi retirado para o devido contentor devido a falta de carrinhos de mão para os agentes de limpeza da Câmara Municipal de Bissau (CMB).
Os vendedores alegaram que aquela situação era incompreensível, dado que pagavam diariamente 150 francos cfa cada, aos agentes da CMB, por isso entendiam que os serviços competentes da edilidade estariam em condições de comprar os tais carrinhos para retirar o lixo do interior do mercado.
A nossa reportagem visitou igualmente as casas do banho do mercado que se encontram a 50 metros de distância. O mercado possui oito casas de banho, quatro para homens e outros tantos para mulheres.
Elas apresentam algumas condições de higiene, dado que a CMB recrutou um grupo de jovens para o serviço da limpeza das mesmas. Cada utilização é cobrada ou a 25 F.CFA (vinte e cinco francos cfa) para a utilização do urinol e a 100 F.CFA (cem francos cfa) para as sanitas. O dinheiro das cobranças é usado para a compra de materiais e eventualmente para fazer pequenas reparações bem como para comprar produtos de higiene.
Em termos de segurança, o mercado de Caracol não dispõe de um único elemento da polícia para garantir a segurança das pessoas e dos bens. Apenas tem guardas-nocturnos contratados pelos próprios vendedores para controlar os seus boutiques. No que diz respeito à água, Caracol tem água canalizada junto às casas de banho.
GLÓRIA CÓ RESPONSABILISA A CMB PELA FALTA DE CONDIÇÕES DE HIGIENE
Aspecto do mercado de Cacheu, com mulheres a vender produtos no chão
A responsável das mulheres vendeiras do mercado, Gloria Có, responsabiliza a CMB pela falta de condições de higiene no mercado, porque os agentes da CMB tinham prometido há muito tempo que construir balcões para evitar que as vendedeiras colocassem os seus produtos no chão e assim garantir melhores condições de higiene, mas até a data não construíram nada.
“Não queremos vender desta forma, mas não temos como fazer, por isso expomos os nossos produtos no chão. Pagamos pela utilização do espaço um valor de 150xof por dia cada uma, portanto esperamos que os agentes de saneamento da Câmara honrem os seus compromissos com as vendedeiras deste mercado, o mais procurado na capital”, explicou.
Glória Có informou ainda que o mercado de Estado pode não ter condições de higiene, mas tem mais garantias de utilização em relação ao mercado improvisado, poque de repente o proprietário deste pode expulsar os utentes para alí construirem uma casa ou um empreendimento qualquer, por isso, toda a gente anda a procura de espaço nos mercados de Estado, que poderão ser usados para o resto das suas vidinhas.
VENDEDORES ABANDONAM A ‘FEIRA DE KIRINTIN’ ALEGANDO FALTA DE CLIENTES
A nossa reportagem seguiu para o mercado de Bandim, concretamente no cantinho denominado de ‘feira de Kirintin’, onde encontrou um mercado quase vazio em termos de produtos, mas com as condições de higiene favoráveis para desenvolver actividade comercial.
A fraca presença das vendedeiras naquele mercado tem a ver com a execução das obras pela Câmara. Enquanto se realizavam as obras, a CMB pediu às utentes que o deixassem temporariamente para depois voltarem quando as reparações fossem concluídas. Após o termino das obras, a maioria dos vendedores não voltou alegando a falta de clientela, que, entretanto se habituara aos outros espaços.
Agora o que se regista mais neste mercado é a presença de jovens que usam as prateleiras que serviam para vender peixe, para colocarem os seus computadores e televisores para os jogos de ‘playstation’ para crianças e adultos que gostam de desfrutar com a magia do Cristiano Ronaldo e Leonel Messi e mais outros jogadores e outros jogos, pagando um valor que varia de 25 a 100 francos cfa.
Crianças a jogar Playstation no mercado de tambarina
Ao contrário do Mercado de Caracol onde os utentes pagam pela utilização das casas de banho para urinar, no mercado de Bandim (feira de Krintin) ninguém paga para urinar e apenas se paga 100 francos cfa para a defecação.
VENDEDORES DA FEIRA DE CACHEU PAGAM À CÂMARA E AO PROPRIETÁRIO DE ESPAÇO TODOS OS DIAS
O mercado improvisado “Feira de Cacheu”, que se encontra no interior do Bairro de Mindará, não dispõe de condições para o exercício de actividade comercial, tendo em conta a limitação de espaço, que não permite a facilidade de circulação dos utentes.
A este mercado improvisado foi dado o nome de “Feira de Cacheu”, porque a maioria das pessoas que vendia peixe ali eram “videiras” provenientes de Cacheu. O mercado não tem nenhum edifico coberto para proteger as pessoas do sol ou da chuva.
Os utentes deste mercado improvisado pagam o espaço duas vezes: pagam aos proprietários do terreno e à Câmara Municipal. Os próprios utentes confessaram à nossa reportagem que se sentem mal com a situação, mas não têm como fazer, porque se não o fizerem perdem o espaço e os prejudicados serão eles que ficarão em dificuldades para conseguir uma forma apoiar a sobrevivência dos seus filhos e familiares.
Tal como os seus colegas dos outros mercados, os vendedores daquele mercado expõem os seus produtos no chão, por vezes em sacos de plástico, ao lado do lixo. Essa situação é feita debaixo dos olhares dos agentes da CMB que passam pelo local para as cobranças dos 150 francos cfa todos os dias.
FRANCISCA PEREIRA: “A CÂMARA SÓ SABE FAZER COBRANÇAS, MAS NÃO FAZ LIMPEZA”
A responsável das mulheres vendedeiras do mercado improvisado “Feira de Kirintin”, Francisca Pereira Batista, explicou à nossa reportagem que a época da chuva é o período mais difícil para as mulheres que praticam actividades comerciais naquele mercado, devido a água suja que corre no espaço onde expõem os seus produtos para vender.
“Os agentes da Câmara Municipal de Bissau só sabem fazer cobranças, mas não fazem a limpeza. Pagamos 150 fcfa à Câmara e 150 fcfa ao proprietário do terreno. Mas somos nós que fazemos a remoção do lixo e inventámos barracas para que possamos abrigar do sol e da chuva”, contou.
A senhora Francisca Batista assegurou ainda ser urgente a colocação de policiais nos diferentes mercados, como se faz no período da quadra festiva, para evitar certos problemas que acontecem no mercado. Adiantou ainda que com a segurança no mercado, as vendedeiras estariam tranquilas nas suas atividades de procurar o pão para alimentar e sustentar estudo das crianças.
Aquela responsável advertiu que o mercado de Granja, que foi reabilitado pela Câmara, não tem espaço suficiente para albergar todas as vendedeiras deste mercado improvisado, por isso recusaram ir para aquele espaço. Acrescentou que a melhor forma das pessoas saírem nesse lugar é criar um mercado que possa albergar toda a gente para evitar situações de uns a negociarem e outros ficarem a ver os clientes passar.
“Compreendemos muito bem o risco de vida que corrermos a beira de estrada, mas não temos como fazer. Temos crianças cuja alimentação e estudos temos de pagar, temos que pagar a renda da casa e ainda comprar roupas para vestir. Decidimos ficar aqui, mas quase todos os dias a polícia municipal retira-nos os produtos”, notou.
A nossa reportagem falou com os proprietários do espaço improvisado da “Feira de Krintin” que acusaram as vendedeiras de abusarem no espaço, e de muitas vezes recusarem pagar, além de sujarem as suas varandas com restos de legumes e escamas de peixes.
“Esta situação preocupa-nos muito, mas decidimos sofrer, porque é através desta atividade que conseguimos sustentar os nossos filhos e pagar os seus estudos. Compreendemos esta preocupação, conseguimos aguentar o barulho, os insultos e as brigas neste espaço”, observou.
Questionado se pagam à Câmara alguma taxa pelas rendas do espaço, respondeu que não podem pagar à Câmara Municipal de Bissau, porque todos anos são obrigados a pagarem foro.
“A Câmara Municipal de Bissau não tem direito de fazer cobranças no nosso espaço, mas como neste país cada qual faz como entende… Por isso as vendedeiras são obrigadas a pagar duas vezes”, espelhou.
Por: Aguinaldo Ampa/ Epifania Fernandes Mendonça