Marfinenses vão às urnas pela primeira vez desde crise política que deixou mais de 3 mil mortos em 2010. Presidente Alassane Ouattara é tido como favorito, mas teme abstenções.
No domingo (25.10), cerca de 6 milhões eleitores da Costa do Marfim vão às urnas pela primeira vez desde a sangrenta eleição presidencial de 2010, que deixou mais de três mil mortos. Nas últimas semanas, muitos marfinenses decidiram deixar o país temporariamente com o temor de retorno da violência.
"Estou realmente com medo. Isso acontece na Costa do Marfim desde muitos anos. Quem fala em eleição, fala em guerra. E depois de cada guerra é preciso começar tudo de novo”, diz Fatim Kéita, moradora de Abdijã, a capital econômica do país.
A reeleição do presidente Alassane Ouattara é dada como certa. Na campanha eleitoral, o político de 73 anos tenta mostrar que o país superou a instabilidade política e destaca a importância econômica da Costa do Marfim na África Ocidental, como o maior produtor de cacau do mundo. Segundo o Banco Mundial, a economia do país cresceu 9% nos últimos três anos. O governo de Ouattara, no entanto, teme abstenções e falta de comparecimento às urnas.
O ex-ministro de Assuntos Estrangeiros do país Amara Essy, membro da Coalizão Nacional para a Mudança criada em maio pela oposição, suspendeu a candidatura sob o argumento de que o processo eleitoral é antidemocrático.
"Temos provas de que o processo eleitoral está nas mãos dele", disse em referência a Alassane Ouattara. O ex-presidente do parlamento Mamadou Koulibaly também retirou sua candidatura. Políticos de destaque da Costa do Marfim ameaçam boicotar as eleições. Apenas quatro dos oitos candidatos que concorrem à presidência assinaram um "código de boa conduta para eleições pacíficas", elaborado pela comissão eleitoral.
Quatro anos depois do fim da guerra civil, entre 2010 e 2011, as tensões entre o governo e a oposição ainda são fortes. Com o anúncio dos novos candidatos em setembro, foram registrados motins. “Tem havido mortes. O que vemos no momento não é reconfortante. Temos medo que essas coisas se repitam”, conta uma marfinense. Simpatizantes da oposição também foram às ruas de Abdijã em protesto por um acesso mais amplo aos meios estatais de comunicação.
Histórico de violência
Em 2010, observadores internacionais declararam o candidato da oposição Alassane Ouattara como o vencedor. O ex-presidente Laurent Gbagbo, que estava no poder desde 2000, não aceitou a derrota. Durante um mês, a Costa do Marfim teve dois presidentes, dois governos e dois exércitos e intensos confrontos, que obrigaram mais de 500 mil pessoas a deixarem suas casas.
Depois de intervenção da ONU e de tropas francesas, Laurent Gbagbo foi detido em 2011. O político será julgado em novembro pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes contra a humanidade.
Para Martin Johr, representante da Fundação Friedrich Ebert em Abdijã, o processo de reconciliação não progrediu o suficiente.
"Houve iniciativas como comissões da verdade e de reconciliação introduzidas para esclarecer atos de violência e identificar indivíduos que devem ser compensados”, diz. “Isso deveria ser um princípio importante da justiça de transição. Mas os resultados não são convincentes. O relatório final não é público, por exemplo."
Para o presidente da Liga de Direitos Humanos da Costa do Marfim, Yacouba Doumbia, a violência continua a ser parte integrante da política da Costa do Marfim. "Infelizmente, a oposição tem problemas para encontrar uma estratégia. Gbagbo não está lá, mas o seu espírito de guia ainda está muito presente na cena política", observa. DW-África