A guerra civil que devastou Moçambique durante 16 anos não foi iniciada por vontade dos moçambicanos e a Renamo foi criada por forças contrárias à independência e antidemocráticas, disse à agência Lusa Joaquim Chissano, antigo Presidente moçambicano.
O início da guerra em Moçambique «não é uma vontade de moçambicanos que tiveram contradições, que explodiu. (...) Não vamos simplificar as coisas e dizer “ah, é vontade de uns jovens, porque se reuniram numa mata e decidiram chamar-se Renamo”, afirmou Chissano, em entrevista à Lusa, alusiva aos 40 anos da independência do país, que se assinalam no próximo dia 25.
Segundo o antigo chefe de Estado moçambicano, entre os mentores da guerra desencadeada em Moçambique, um ano após a proclamação da independência, estão figuras ligadas ao regime colonial português e admiradores de António Salazar, que eram contra a independência do país e prepararam as suas ações a partir da Rodésia, atual Zimbabwe, e da África do Sul – países que na altura eram dirigidos por regimes racistas.
«Não se chamava nem sequer isso [Renamo], não existia essa coisa que se chamava Resistência Nacional. O que havia era a Voz de Moçambique Livre, e estava sedeada na África do Sul, eram portugueses que estavam lá», afirmou Joaquim Chissano, mencionando Jorge Jardim e Orlando Cristina, afetos ao regime colonial, como os precursores da organização.
«Se o conflito tivesse sido instigado por moçambicanos», prosseguiu o ex-chefe de Estado e dirigente da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), partido no poder, «o movimento que lançou a guerra não havia de se autodenominar através da sigla inglesa MNR, e teria logo adotado a designação Renamo».
«[Quem estava por detrás da guerra] não era nenhum chamado Cossa ou Phiri [nomes de línguas nativas moçambicanas] ou qualquer coisa assim, era Orlando Cristina, português, que serviu nos serviços secretos portugueses», destacou Joaquim Chissano.
Sobre a insistência daquele que mais tarde viria a ser o líder da guerrilha da Renamo, Afonso Dhlakama, de que a sua luta visava a instauração da democracia em Moçambique, Chissano acusou o movimento de ter servido os interesses de forças contrárias à independência e à liberdade dos moçambicanos. «Eu já lhe disse que ele não tem democracia nenhuma a ensinar, porque a Frelimo foi precisamente constituída para lutar pela democracia. A Frelimo estava a lutar contra quê, afinal? Estava a lutar contra a ditadura colonial fascista de Portugal, pela democracia, a liberdade e os Direitos Humanos. O que nos inspirou a nós todos foi a luta pelos Direitos Humanos», declarou.
Para Chissano, o facto de a Renamo ter sido abertamente apoiada por dois governos de minoria branca na África Austral e que estavam sob sanções da comunidade internacional demonstra que a agenda do movimento nunca foi a implantação da democracia em Moçambique. «Não foi Dhlakama que veio cá lutar pela democracia, ele foi lutar contra a democracia. Quem apoiou a Renamo? Foi a democracia ou foi 'apartheid', foi a democracia ou foi o regime minoritário racista da Rodésia?", indagou o antigo chefe de Estado moçambicano. Fonte: Aqui