segunda-feira, 12 de junho de 2017

OPINIÃO: CUSTOS DA UEMOA PARA A GUINÉ-BISSAU – DUAS CHAVES PARA 100 PORTAS

[PARTE 1: Política Monetária] Nas últimas décadas, o crescimento económico verificado na Guiné Bissau se situa a cima da média mundial, embora isso não se refletir na vida dos guineenses. O desemprego continua acentuado e cada vez mais agravante. Perante esse e mais outros fenómenos económicos, é urgente encontrar instrumentos de mercado de modo a garantir o melhor equilíbrio macroeconómico.
 
Com adesão a UEMOA, o país beneficiou de uma certa segurança cambial e a estabilidade dos preços (a taxa de inflação antes da adesão rodava acima dos 50%, atualmente é de 2% em média), mas isso custou a perda da autonomia monetária e a exposição aos eventuais choques assimétricos.
 
Nas economias de mercado, a estabilidade macroeconómica é garantida pelas duas grandes entidades: O Banco Central, através da política monetária e o Ministério das Finanças pela política orçamentária (fiscal e salarial). Nas uniões monetárias, o banco central de acordo com o seu mandato, responde pelo equilíbrio agregado da economia da zona, enquanto que os ministérios das finanças locais conduzem as suas políticas orçamentárias em direção aos objetivos específicos e em defesa aos eventuais choques assimétricos da politica monetária. Ora, na Guiné-Bissau, as duas chaves não têm sido eficientes na economia real: a política monetária é quase ausente e a política orçamentária continua a degradar-se.
 
Na primeira fase, o presente artigo concentra-se na primeira “chave” (política monetária do BCEAO) – como ferramenta que visa a nortear as principais variáveis macroeconómicas como a inflação, o desemprego e o crescimento econômico sustentável. 
 
O BCEAO, tal com qualquer banco central, tem o seu mandato que será concretizado através de certos instrumentos, que merecerão uma abordagem sumária nos parágrafos subsequentes. Conforme o artigo 8 do estatuto do BCEAO, o mandato do BC é de garantir a estabilidade dos preços nos países membros da UEMOA. Portanto, o desemprego, o crescimento econômico e outros fenómenos macroeconómicos são de inteira responsabilidade dos ministérios das finanças locais. A atual situação económica da Guiné-Bissau oferece uma larga margem para combater o desemprego e garantir o crescimento económico sustentável sem afetar o objetivo do BC (inflation targeting), uma vez que, o percurso é longo para o pleno emprego.
 
Para cumprir com o mandato, o BCEAO utiliza dois instrumentos convencionais: o mercado aberto (open market) e as operações repurchase agreement (REPO) junto das instituições financeiras.
 
Open market é um mecanismo utilizado pelos bancos centrais para garantir a liquidez (dinheiro) necessária na economia através da compra e venda de títulos (mais comum, os bilhetes de tesouro). O BC (banco central) vende os títulos quando necessita de remover a liquidez da economia, e compra quando é necessário enjeitar a economia. Esse instrumento tem um efeito a curto prazo nas taxas de juro interbancárias, e é muito eficiente no controle da inflação num determinado corredor (inflation targeting).
 
Entretanto, esse instrumento exige um largo portfólio de títulos para travar as pressões inflacionárias. O tamanho deste portfólio depende do número dos bilhetes de tesouro (BT’s) emitidos pelos governos dos países membros. A insuficiência de títulos condiciona as operações da remoção da liquidez para travar as pressões inflacionárias. 
 
Esta pode ser uma das rezões que levaram a Guiné-Bissau a emitir tantos bilhetes de tesouro junto ao BC. Nas Economias desenvolvidas, para evitar que os bancos financiem diretamente o orçamento de Estado, o que lhes daria certos poderes de influência na vida política do país, é proibido a transação dos bilhetes de tesouro no mercado primário. Na ausência de mercado secundário (bolsas) e a fraca liquidez dos bilhetes de tesouro o, lógico comprador dos BT’s da Guiné-Bissau é o BCEAO. Dado a fraca liquidez destes BT’s, a única forma de torná-los atrativos é elevar o valor do cupon, o que consequentemente, aumenta os encargos do governo para cumprir com as suas obrigações de contrato. Logo, o governo reage novamente com a restrição orçamental para dar a entrada aos novos títulos – o primeiro choque da política monetária com a política orçamentária.
 
O segundo instrumento (repurchase agreement, REPO) é utilizado para influenciar a taxa de juros de MMI (Mercado Monetário Interbancário) e a taxa overnight (taxa MMI a 24h) devido a sua natureza de curta duração. Geralmente, as operações de REPO são semanais ou mensais e constitui uma ferramenta do BC para enjeitar/remover certo volume de liquidez através de uma taxa de juro mínima pré-estabelecida (em alguns países a taxa de juros é fixa).  O BC também pode controlar a massa monetária através das reservas exigidas junto aos bancos comerciais. Essa estratégia tem um efeito imediato nos balanços dos próprios bancos comerciais e consequentemente, na poupança e no clima de investimento. A REPO tem um fraco impacto na economia real da Guiné-Bissau, devido a baixa taxa de bancarização e ao débil rendimento das famílias.
 
Para aumentar a taxa da bancarização é necessário criar instituições de microcrédito e bancos especializados. O setor agrícola merece toda a atenção, visto que, é principal impulsionador do crescimento económico da Guiné-Bissau, no entanto, a criação de banco agrícola é muito aconselhável para dinamizar o setor num momento em que o preço da castanha de cajo atingiu o nível histórico. As mulheres “bideras” são locomotoras do consumo, mas, o fraco nível de alfabetização bancaria e a informalidade das suas atividades travam o acesso ao financiamento bancário para alavancar as suas produções. Uma das soluções seria a criação de instituições de microcrédito tradicionais, tal como fez o nobel da paz, Muhammad Yunus (o banqueiro dos pobres) em Bangladesh. 
 
(próximo artigo, a política orçamentária)
                                                                                                                                                            
Por: Suleimane Djalo
Finalista de Master em Economia Monetária e Financeira
Universidade ISCTE-IUL, Lisboa /Portugal