domingo, 20 de setembro de 2015

COVEIROS DE ANTULA EXIGEM TRATAMENTO DIGNO COMO TRABALHADORES E NÃO COMO MENDIGOS

Cimetério do Bairro de Antula
Os coveiros do cemitério do Bairro de Antula, arredores da cidade de Bissau, exigem do patronato um tratamento digno como pessoas e como trabalhadores e não como mendigos. A denúncia de mau tratamento da parte do patronato, a Câmara Municipal de Bissau, através da sua direção do saneamento, foi feita pelos próprios coveiros, mas que pediram o anonimato a equipa de reportagem do semanário “O Democrata”.
 
Uma equipa de “O Democrata” realizou esta semana uma reportagem sobre a situação dos homens e jovens que, devido às dificuldades da vida, decidiram assumir a profissão de coveiro nos dois cemitérios. A verdade é que coveiro é uma profissão menosprezada e considerada de menor importância na nossa sociedade e poucos jovens estarão disponíveis para abraçá-la. Contudo, ser coveiro é lidar com os defuntos todos os dias, bem como passar todo o tempo com os defuntos já enterrados no cemitério.
 
De acordo com as informações apuradas pela nossa reportagem, o cemitério de Bairro de Antula tem mais de 400 metros quadrados. Na altura da sua construção fora subdividida em três partes a saber: uma para a comunidade muçulmana outra para a comunidade cristã e animistas e a última – a parte central – destinada como um panteão nacional, destinada na altura a figuras nacionais.

COVEIROS QUEIXAM-SE DE FALTA DE ASSISTÊNCIA ADEQUADA E CONDIÇÕES DE TRABALHO
 
Os coveiros contactados pela nossa reportagem queixaram-se da falta de uma assistência adequada associada à falta de boa alimentação e de água potável. Segundo um dos trabalhadores que pediu anonimato, a situação é de total precariedade. Em certas ocasiões, nota a nossa fonte, são obrigados a beber da água dos fontenários sem os mínimos cuidados higiénicos e estando assim vulneráveis a graves riscos de saúde.
 
Um dos nossos interlocutores explicou à nossa reportagem que por várias vezes encetaram conversações junto dos responsáveis máximos de Câmara Municipal de Bissau no sentido de lhes serem melhoradas as condições de trabalho, mas sem resultados.
 
De acordo com a mesma fonte, uma das exigências dos trabalhadores tem a ver com os materiais de trabalho (enxadas, picaretas e pás), aumento de funcionários e a efectivação do pessoal que opera no local há cinco anos sem um contrato oficial assinado com a direção da Câmara Municipal de Bissau.
 
“O Democrata” soube ainda que o grupo dos trabalhadores que opera no cemitério de Antula do lado dos muçulmanos terá exigido à edilidade de Bissau o aumento do número de trabalhadores passando de cinco (5) para doze (12) tal como acontece na zona onde os cristãos são sepultados.
 
Segundo dados disponibilizados pelo nosso entrevistado, ao todo eram sete (7) pessoas que trabalhavam na zona onde os muçulmanos são sepultados, dois acabaram por desistir devido as dificuldades e a más condições de trabalho.
 
“Estamos cansados e precisamos do apoio dos responsáveis da Câmara Municipal de Bissau. Escolhemos o que sabemos fazer, porque nem todos podem trabalhar nos gabinetes e secretarias. Somos difamados e injúriados desnecessariamente só porque decidimos ser coveiros”, lamenta. Todavia, adianta que “a nossa convicção é que o trabalho que estamos a fazer é para o bem da nação guineense, e não nos interessa o que dizem de nós e a forma como somos tratados ” notou.
 
Não obstante a situação de precaridade, os sepultadores dizem que estão determinados em continuar a cumprir a sua obrigação esperando que a Câmara cumpra também com a sua parte, para dignificá-los.
 
Segundo este crente muçulmano, quem faz o trabalho de coveiro demostra a sua crença em Deus. Sendo assim, afirma estarem preparados para continuar a dar a sua contribuição em em nome do Sagrado Alcorão.
 
“O Conselho Superior Islâmico tinha prometido que a cada sexta-feira, juntaria fundos em dinheiro oferecidos nas diferentes mesquitas para apoiar os coveiros muçulmanos, mas não foi o caso. Só nos apoiam no momento de Ramadão com açúcar e carnes provenientes de Cidade Santa de Meca”, revela.
 
“Estamos a enfrentar enormes dificuldades no que toca boa alimentação, falta de água potável que mais tarde pode acarretar graves prejuízos para a nossa saúde, falta de recursos humanos e materiais de trabalho” acrescenta.
 
No entendimento deste homem que se dedicou a causa social há cinco anos, eles devem merecer um tratamento condigno por parte da Câmara Municipal de Bissau como todos outros funcionários do Estado.
 
“Estamos orgulhosos em trabalhar não só para a nossa sobrevivência, mas também para os que deixaram o mundo dos vivos. A nossa missão demostra a humildade e a nossa honestidade em trabalhar sem nos preocuparmos com o enriquecimento ilícito“ salientou.
O nosso entrevistado revelou que estão a trabalhar desde 2011 até a data presente sem serem efectivados, facto que considerou de muito preocupante. Sustentou ainda que tinham recebido garantias da direcção da Câmara Municipal de Bissau que seriam efectivados, mas até à data, esta promessa não foi cumprida.
 
A fonte apelou, no entanto, à direcção superior da Câmara Municipal de Bissau a dar um tratamento condigno aos funcionários do cemitério municipal de Antula e criar condições de trabalho para que possam exercer melhor as suas funções.
 
O nosso jornal soube ainda de uma fonte dos coveiros que, as relações entre coveiros cristãos e muçulmanos do cemitéiro de Antula são saudáveis porque trabalham em sintonia e gozam do mesmo estatuto, trocam impressões e experiências.
 
Contudo as condições financeiras, laborais e materiais continuam péssimas para os trabalhadores que recebem, mensalmente, 60 mil francos CFA (91 euros).
 
COVEIRO CRISTÃO: “RECEBEMOS MAL E AO MESMO TEMPO TEMOS FALTA DE MATERIAIS DE TRABALHO”
 
Um dos representantes dos coveiros da parte dos cristãos contou à nossa reportagem que  na verdade recebem mal e ao mesmo tempo deparam-se com dificuldades de materiais de trabalho. Faltam-lhes enxadas, picaretas, entre outros.
 
“O trabalho que fazemos aqui é muito perigoso. Aliás, como se sabe, nem toda gente aceita fazer o trabalho de coveiro nos cemitérios. Lidamos aqui com muitas coisas, mas mesmo assim, aceitamos fazer o trabalho. Exigimos pelo menos que nos tratem com dignidade, como pessoas trabalhadoras, e não como mendigos, porque trabalhamos”, assegurou o velho coveiro de mais de 50 anos de idade.
 
Explicou ainda que já fizeram diligências junto aos responsáveis máximos da direcção que se ocupa do cemitério sobre um eventual aumento salarial. Contudo, mostrou-se reticente sobre a possibilidade de conseguirem o tal aumento da parte do patronato, dado que até a presente data não foram convocados ou informados sobre nenhuma decisão tomada pela Câmara Municipal de Bissau.
 
Entretanto a nossa equipa de reportagem contactou o responsável de saneamento da Câmara Municipal de Bissau para esclarecer a situação dos coveiros que alegam falta de condições de trabalho, bem como da falta de um bom salário.
 
O responsável de saneamento, João Intchama disse à nossa reportagem que não pode falar à imprensa sem a autorização do seu superior.
 
Por: Rafaela Iussufi Quetá/Aguinaldo Ampa