domingo, 30 de julho de 2017

Opinião: FRANCO CFA A MOEDA ASSASSINA

Franco das colónias francesas de África (franc des colonies françaises d’Afrique), denominado mais tarde de Franco da Comunidade Financeira de África, foi criada em Dezembro de 1945 através do decreto no 45-0136 assinado pelo General Charles de Gaulle, com o objectivo de controlar os capitais que circulam principalmente nas suas colónias. A zona franco teve a sua origem nos anos 30 do século XX, mas o Franco CFA em si, foi oficialmente criado em 1945.
 
Quatros princípios regem a cooperação monetária entre a França e os países da zona franco, a saber:
 
1) a paridade fixa com a moeda de referência (neste caso euro);
2) a garantia da convertibilidade ilimitada pelo tesouro francês;
3) a livre transferibilidade da moeda no interior da zona franco;
4) a centralização das reservas de câmbio.
 
A paridade fixa do franco com o euro é garantida pelo tesouro público francês, mas em contrapartida, os países africanos da zona franco, são obrigados a depositar 20% de sua emissão monetária (sob forma de divisa) junto ao tesouro público francês. Atualmente, a taxa de cobertura de emissão monetária ultrapassa 112%, isto é, 5171,8 bilhões de franco CFA.
 
Na realidade significa que para emitir 1 franco, o banco central (da zona franco) deve depositar 0.20 cêntimos no tesouro francês como garantia de paridade fixa entre franco e euro, mas os 0.20 cêntimos deve ser depositado em forma de divisa. Isto é, entregamos 1 franco, mas temos direito só a 0.80 cêntimos, ou então, antes de emitir 1 franco, o banco deve ter no tesouro francês 0.20 cêntimos em forma de divisa como garantia de paridade.
 
A convertibilidade das moedas emitidas pelas três instituições de emissão da zona franco, e a livre circulação das mesmas dentro da zona euro é garantida sem limite pelo tesouro francês, em contrapartida, as reservas de câmbio devem ser centralizadas. Para garantir a “convertibilidade ilimitada” de Franco CFA com o euro, a França exige que os países da zona Franco depositem 50% de suas reservas cambiais em uma conta chamada de “conta de operação” do tesouro público francês, em Paris. Isto é, 50% de todo o dinheiro (em divisa) que vem das importações e exportações vai para o tesouro público francês. Estima-se que mais de 15 bilhões (uns falam de mais de 50 bilhões) de euros estão depositados na dita conta de operação do tesouro público francês.
 
Na realidade, o Franco CFA não é livremente convertível, porque mesmo entre os países de África Central e Ocidental que utilizam a mesma moeda, a convertibilidade não é permitida. Se um guineense quiser viajar para o Gabão, tem que trocar os seus francos em euro, porque no Gabão o franco de África Ocidental não é aceitável, apesar de utilizarem a mesma moeda.
 
Oficialmente, cada FCFA é gerido pelo Banco Central, mas a França tem o direito de nomear um membro no conselho de administração do BCEAO (artigo 80 do estatuto do BCEAO) com o direito de voto (e de veto). As decisões do conselho são tomadas por maioria simples dos votos expressos pelos membros. Qualquer decisão tomada pelo BCEAO pode ser vetada pelo Banco da França caso não representar o interesse deste último. As fábricas de produção do FCFA estão situadas no Sul da França, concretamente em Clermont Ferrand, região Bordeaux.
 
Gostaria de apresentar-vos alguns dados, antes de entrar numa análise critica e mostrar as desvantagens desta moeda:
 
1.1 Tabela de síntese dos dados económicos dos países da zona franco (zona UEMOA)
 
 
Países
PIBPIB real (taxa de crescimento %)Taxa de investimento (em %)Balança comercial
(em % do PIB)
 
IDH 2015
(posição)
Em bilhões FCFAEm dólar por habitante
Bénin5 013,27815,229,5-5,9167
Burquina Faso6 576,96154,027,4-1,9185
Costa de Marfim18 971,3131510,320,210,7171
Guiné-Bissau600,95954,89,32,9178
Mali7 739,18026,017,3-1,8175
Níger4 224,74153,550,7-11,7187
Senegal8 049,69136,523,7-15,2162
Togo2 367,45695,521,2-15,9166
Total53 543,17,024,4
 
Indicadores de desenvolvimento 2015, Banco Mundial
 
O comércio intra comunitário entre os países da zona franco oscila entre 13 e 15%, e 11 dos 15 desses países têm os piores índices de desenvolvimento humano do mundo. Podemos associar esta situação a má governação e corrupção, mas sem esquecermos da importância da moeda na economia, finanças e até melhoria de condições de vida de todo um povo. Os países da zona franco têm poucas possibilidades de financiarem as suas economias, devido aos compromissos que têm com o tesouro público francês.
 
O Marrocos saiu da zona franco, e passados alguns anos, tornou-se no maior investidor de alguns países da zona franco. A China tem mais de 2500 empresas em África, e investiu mais de 200 bilhões de dólares em África que a fez tornar-se no primeiro parceiro comercial de África. Onde está a França que gere a moeda de 15 países de África?
 
O franco CFA não foi e nunca será vector de transformação das economias da região, e muito menos da diversificação de suas exportações. Em 2015, as quatro principais economias de África Subsariana beneficiárias de fluxo de investimento direto estrangeiro são Angola (8,6 bilhões de dólares), Moçambique (3,7 bilhões de dólares), Gana (3,1 bilhões de dólares) e a Nigéria (3,1 bilhões de dólares), mas nenhum destes países utiliza o franco CFA. Os principais parceiros económicos da França em África são Nigéria, Angola e África de Sul (nenhum deles utiliza o franco CFA). Se a França tivesse confiança nos países da zona franco e nas suas moedas, por que investir mais nos países que nem utilizam o franco CFA?
 
No que diz respeito a Guiné-Bissau, não vejo a necessidade de a mesma fazer parte desta zona com um PIB de 600,9 bilhões de FCFA e uma de taxa de investimento de 9,3%, enquanto que a média entre os 7 países da UEMOA situa-se nos 27% anual. Uma economia fraca não tem necessidade de utilizar “moeda forte” e muito menos com uma paridade fixa e condições como aquelas impostas pelo banco da França aos países da zona franco.
 
Recuando um pouco na história, gostaria de lembrar-vos caros leitores de O Democrata que o Presidente Sylvanus Epiphanio Olympio foi assassinado pouco tempo depois de romper o acordo monetário com a França relativamente ao franco CFA em 1963. O Presidente e pan-africanista Thomas Isidore Sankará foi barbaramente assassinado em 1987 justamente por defender a soberania económica de África. Também não podia deixar de citar o nome do Presidente Modibo Keita que foi envenenado em 1977 por defender uma moeda africana.
 
O que fazer perante uma moeda que empobreceu e empobrece ainda mais os 15 países de África?
 
1 – romper o contrato com a França sobre o franco CFA e exigir a devolução de todo o dinheiro depositado no tesouro público francês (estamos mesmo a precisar daquele dinheiro);
 
2 – criar uma nova moeda africana e fábricas para a produção da mesma no continente africano (a moeda tem que ser africana e controlada pelos africanos);
 
3 – ir à procura de novos investidores dos países emergentes e desenvolvidos;
 
4 – estruturar e diversificar as nossas economias (ir à procura de novas fontes de receitas);
 
 
 
Por: Demar dos Santos
Gestor
Julho 2017