Depois de sofrer uma excisão aos 8 anos, na Guiné-Conacri, e ser casada à força aos 13 anos, Diaryatou Bah cresceu e passou a militar contra as mutilações sexuais que destroem a vida de meninas, alertando as adolescentes que passam férias no país de origem de seus pais para esse risco.
"Fui convidada a acompanhar uma mulher em um quarto e me vestiram com apenas uma tanga. Ninguém me disse o que iria acontecer, seguraram meus braços, minhas pernas e eu fui excisada", conta à AFP a mulher, de 31 anos, que chegou à França há 17.
"O grito da excisão é um grito de dor que é impossível de esquecer", diz Diaryatou, embaixadora de uma campanha de prevenção chamada de "Excisão, vamos falar sobre isso!".
Na época, em sua aldeia, era a tradição. "Se uma menina não era mutilada, não era normal", diz a jovem que tomou conhecimento do que havia sofrido - retirada do clitóris e dos pequenos lábios - ao contar sua história muitos anos depois.
Em 2016, a ONU Mulheres contabilizava 200 milhões de meninas e mulheres submetidas a alguma forma de mutilação genital nos países mais afetados (27 países africanos, Iêmen, Iraque e Indonésia).
Na França, onde a prática é proibida, estima-se em 60.000 o número de mulheres circuncidadas, de acordo com a rede de associações Excisão, vamos falar sobre isso!, que lançou uma campanha e um site para educar as jovens que vão passar as férias nos países de origem dos seus pais onde a prática é comum, como Senegal, Mali, Egito, Guiné e Costa do Marfim.
"Podemos ter uma família moderna, independente, que uma vez na África sofrerá o peso da tradição, pressão da família. É preciso apenas 10 minutos para que uma menina seja mutilada e este trauma ela carregará por toda a sua vida", alerta Diaryatou, que reluta em levar sua filha de 18 meses a Guiné-Conacri.
- Envolvendo os homens -
Casada aos 13 anos e meio com um polígamo 30 anos mais velho, ela deixou seu país e foi para a Holanda. "Aos 14 anos, o casamento é algo teórico, que você conhece pelos romances. Eu não estava preparada, não conhecia nada, a sexualidade era um tabu", diz Diaryatou, que sofreu abuso conjugal, espancamentos, insultos e isolamento.
Ao completar 17 anos, o casal mudou-se para perto de Paris. Muitas vezes deixada sozinha e sem dinheiro, enquanto seu marido visitava as outras esposas, ela se sentia "invisível". "Eu não sabia falar francês, nunca havia pegado metrô, não tinha documentos, fui cortada do mundo".
Uma noite, depois de quatro anos de casamento, assistiu a um programa de televisão onde mulheres vítimas de violência contavam suas histórias. Aos 17 anos, de frente para a tela, anotou a palavra "assistente social", a fim de "sair do confinamento".
Apoiada pela Assistência Social à Infância, foi levada a uma residência para jovens, aprendeu francês e recebeu apoio de uma associação e uma psicóloga.
"Foi o testemunho de uma mulher que me salvou. O que eu quero é fazer o mesmo transmitindo a minha história", diz Diaryatou, que trabalha em uma associação que ajuda os excluídos e mulheres fragilizadas, autora em 2006 do livro "On m'a volé mon enfance" ("Roubaram a minha infância", em tradução livre).
Agora que é mãe, diz que perdoou e que sente em paz: "Eu sou uma vítima, mas a minha família, como muitas famílias africanas, herdou essas tradições. Devemos combater a mutilação genital pela raiz, o casamento forçado através da educação para quebrar a ignorância e oferecer escolha para as próximas gerações".
Para as futuras campanhas de conscientização ela gostaria de envolver os homens: "eles também deveriam se comprometer relatando como é viver com uma mulher que foi mutilada, que não sente prazer, que não conhece o seu corpo", conclui.
Fonte: https://br.yahoo.com