De funcionário dos correios a primeiro-ministro do Congo independente, Patrice Lumumba é considerado um herói africano. Fez do combate ao colonialismo um objetivo de vida e foi também por ele que morreu.
Nascimento: a 2 de julho de 1925, em Onalua, uma aldeia no Kasai Oriental, no seio de um família católica e com o nome Elias Okitasombo. Recebeu, na sua aldeia natal, uma educação rudimentar nas escolas missionárias locais. No início dos anos de 1940, mudou-se para Stanleyville, território hoje conhecido por Kisangani, e mais tarde para Léopoldville, na altura capital do Congo Belga, a atual Kinshasa. No seu percurso profissional, Patrice Lumumba ocupou vários cargos: foi funcionário dos correios, jornalista e diretor de vendas de uma cervejaria, enquanto ao mesmo tempo se fortalecia como líder político anticolonialista. Lumumba tornou-se o primeiro primeiro-ministro do Congo independente a 30 de junho de 1960, mas foi rapidamente destituído do poder, em setembro, e colocado em prisão domiciliária, depois do caos em que o país mergulhou após a independência. Em novembro do mesmo ano, Lumumba tentou apanhar um voo para fora do país, mas foi capturado e levado para Lumumbashi (designada Élisabethville até 1966), na província de Katanga, onde foi assassinado a 17 de janeiro de 1961.
Reconhecido: por ser autodidata, idealista e carismático. Patrice Lumumba soube reunir as aspirações de independência dos congoleses. A sua luta até à morte contra o colonialismo conferiu-lhe um reconhecimento que foi muito além das fronteiras do seu país. A 30 de junho de 1960, imagens do seu discurso na cerimónia de independência do Congo deram a volta ao mundo. "Nenhum congolês poderá esquecer que [a independência] foi conquistada na luta, uma luta de sangue, fogo e lágrimas", declarou, antes de detalhar as injustiças sofridas pelos congoleses durante a era colonial, com o rei Balduíno da Bélgica presente na sala.
Ao longo da sua vida, Lumumba escreveu artigos, ensaios e discursos que deixaram claras as suas ideias políticas. Abordou questões sociais bem como o destino do Congo e do continente africano. A sua obra inspirou gerações de intelectuais e ativistas antiimperialistas de África e de outros lugares, incluindo o seu contemporâneo Aimé Césaire.
Estátua de Patrice Lumumba em Kinshasa, capital da República Democrática do Congo
Frases famosas:
"Não estamos contra ninguém, estamos simplesmente contra a dominação, as injustiças e os abusos. (…) Essas injustiças e o complexo de superioridade estúpido exibido pelos colonialistas são a causa do drama do Ocidente em África."
"Começaremos uma nova luta que levará o nosso país à paz, prosperidade e grandeza (…) e colocaremos o Congo no centro do prestígio que resplandecerá da África como um todo."
"Nem agressões brutais, nem maus-tratos cruéis, nem tortura me levaram a implorar misericórdia, pois prefiro morrer de cabeça erguida."
O que selou o destino de Lumumba?
Numa transição que foi organizada apressadamente e sem entusiasmo, a administração colonial belga havia entregue o poder sem fornecer aos novos governantes as estruturas necessárias. Imediatamente após a independência ser declarada, Patrice Lumumba tentou orientar o país a vários níveis. Um dos seus primeiros feitos foi demitir o comandante belga do exército. Na época, o país estava à beira de uma crise da qual resultou a separação das províncias do sudeste de Katanga e do Kasai do Sul, apoiada pela Bélgica. Seguiu-se uma guerra civil e Lumumba enviou as suas próprias tropas.
Numa tentativa de controlar a situação, o ainda primeiro-ministro congolês solicitou ajuda a vários atores internacionais, incluindo a União Soviética. O que, em plena Guerra Fria, se mostrou útil aos seus opositores políticos que se apressaram a colocar várias potências ocidentais contra ele. Norte-americanos e belgas aliaram-se assim ao então chefe do exército Joseph-Desiré Mobutu, que mais tarde chegaria ao poder, tendo governado o Congo por mais de 30 anos, entre 1965 e 1997.
Morte: Quem matou Patrice Lumumba? Várias fontes mostram que, tanto os Estados Unidos da América, como a Bélgica tiveram implicações no complô montado contra Lumumba. Em 2002, o Governo belga, através do ministro dos Negócios Estrangeiros, Louis Michel, pediu oficialmente desculpas à sua família e ao povo congolês.
Num poema publicado em janeiro de 1959, no jornal congolês "Independance", Patrice Émery Lumumba homenageou as vítimas dos protestos pró-independência que haviam ocorrido em Léopoldville, na altura capital do Congo, e que foram violentamente reprimidos pelas autoridades coloniais belgas. "Forçando o respeito do homem branco, dizendo em alto e bom som que a partir de agora este país não lhes pertence mais. Vocês permitiram, assim, que os vossos irmãos de raça ergam a cabeça e encarem de frente o futuro feliz prometido pela libertação.
Patrice Lumumba tomou posse como primeiro-ministro do Congo em 1960
A mudança para a independência começava ali e Patrice Lumumba surgia como o "mentor" do movimento anticolonialista. Em entrevista à DW, Kambayi Bwatshia, professor de História da Universidade de Kinshasa, explica que Lumumba era "um homem deslumbrante, que não gostava de injustiças. Um homem que sabia o que era alienação, que acompanhara o desenvolvimento na Guiné e a forma como os guineenses diziam não à política da comunidade francesa". E foi através deste mesmo caminho que acompanhou na Guiné, acrescenta o professor, que Lumumba "lutou contra as forças coloniais belgas".
O também ex-funcionário dos correios sonhava com a independência do Congo e ambicionava que este foss e um país unido. Mas a sua luta pela união dos povos étnicos e a rejeição das alianças tribais trouxe-lhe inimizades dentro da classe política congolesa. Um ponto que as forças coloniais tentaram aproveitar a seu favor para criar a desordem no país.
Vence o Movimento Nacional Congolês
Com apenas 30 anos e conhecido por ser autodidata, idealista e carismático, Patrice Lumumba tinha o dom da palavra e soube convencer a multidão. Em maio de 1960, naquelas que foram as primeiras eleições gerais da República Democrática do Congo (RDC), o Movimento Nacional Congolês, partido fundado por Lumumba, saiu vencedor. A 30 de junho, e já como primeiro-ministro, Patrice Lumumba dirigiu-se à nação na cerimónia da Independência do país. Um discurso, que ainda hoje é lembrado, e que ficou marcado pelas críticas às forças coloniais:"Uma homenagem aos que lutaram pela liberdade nacional. Nós conhecemos as ironias, os insultos, a violência que tivemos que suportar, de manhã, à tarde e à noite, porque éramos negros. Quem esquecerá os fuzilamentos onde pereceram tantos dos nossos irmãos, as masmorras para onde foram brutalmente atirados aqueles que não se queriam mais submeter ao regime de injustiça, opressão e exploração?", interrogou Lumumba.
Lumumba foi assassinado em 1961
Os congoleses presentes na sala aplaudiram o discurso. Mas para o Rei Balduíno da Bélgica, as palavras deste primeiro-ministro intransigente foram uma afronta. Uma opinião também partilhada por Kambayi Bwatshi. Segundo o professor, Lumumba não só "ofendeu o rei, como a Bélgica".
Kambayi Bwatshi lembra que, após a tomada de posse de Lumumba, tem início uma nova crise: o serviço público e a segurança deterioraram-se no país. Ocorreram diversas rebeliões e a então província de Katanga declarou independência. O mesmo especialista dá conta que "Lumumba não tinha as ferramentas legítimas para governar. Estava sozinho. Os belgas e os imperialistas desorientaram completamente o país. Foi um caos."
A transição caótica do Congo para a independência ficou marcada por grandes episódios de violência - uma sombra na imagem de Lumumba.
Preso e assassinado
A crise acabou por despoletar uma guerra civil. E, pouco tempo depois de ter chegado ao poder, Lumumba foi destituído do cargo de primeiro-ministro e posto em prisão domiciliária. O que viria a beneficiar Joseph Mobutu que, optando por jogar do lado dos colonizadores, acabou por chegar a presidente alguns anos depois. Governou o país mais de 30 anos,m entre 1965 e 1997.
Patrice Lumumba foi assassinado em janeiro de 1961, um crime que causou indignação em todo o mundo. Numa das últimas cartas que escreveu, disse: "A nação saberá que me ofereci como refém pela sua liberdade."
O projeto "Raízes Africanas" é financiado pela Fundação Gerda Henkel.
Fonte: DW África