Igualmente as casernas dos militares e residências dos antigos combatentes da liberdade da pátria, são uma autêntica ameaça à vida humana, não têm mínimas condições, são tão precárias que até se confundem com pocilgas de porcos. Portanto tudo isto, constitui um crime contra a humanidade.
Nos últimos tempos o Centro de detenção da Polícia Judiciária, em Bissau, tem vindo a transformar-se num campo de batalha, de crimes contra a humanidade e de contaminação involuntária por doenças contagiosas graves, devido à falta de condições necessárias exigidas por lei e, por isso é considerado como uma ameaça à vida humana. O centro inicialmente preparado para assegurar apenas os detidos que aguardam pela instrução dos seus processos agora tem a lotação a mais. A falta de condições adequadas levou o centro a ganhar outra dimensão histórica, no capítulo dos direitos humanos (com situações intoleráveis e inexplicáveis).
As condições do centro são tão precárias que acabam por facilitar a fuga de reclusos perigosos e deixar outros em situação desumana e cheia de doenças contagiosas. Por exemplo, no passado mês de outubro, no dia 16, um grupo de 24 reclusos perigosos, alguns condenados a penas de 5 a 7 anos de prisão por crimes de assalto à mão armada a agências bancárias e postos de combustível, evadiu-se das celas em circunstâncias misteriosas e sem a mínima responsabilização dos autores que terão facilitado a fuga.
Boa parte desse grupo ainda continua a monte com consequências imprevisíveis para a sociedade indefesa. Tanto a Liga Guineense dos Direitos Humanos como outras entidades ligadas à problemática dos direitos humanos já pediram, em diversas ocasiões, o encerramento do Centro de detenção da PJ e a criação de uma nova estrutura prisional com condições adequadas para deter criminosos.
CENTRO DE DETENÇÃO DA POLÍCIA JUDICIÁRIA TRANSFORMOU-SE NUM ‘INFERNO’ PARA RECLUSOS
O Centro carece de quase tudo, razão pela qual é tido pelos reclusos como um ‘inferno’. Muitas vezes os detidos entram sãs e saem doentes. O centro não tem casas de banho em condições e nem a água potável para os reclusos e essa precariedade involuntária das celas obriga os reclusos a optarem pela “via de recurso”, consumindo a água apanhada nas casas de banho, que estão em condições desumanas, necessitando de uma reabilitação.
Cada dia que passa representa uma ameaça à vida humana por duas razões: a primeira, um indivíduo é preso sã e quando volta à liberdade, volta contaminado ou doente; a segunda é que pessoas perigosas, condenadas, fogem das celas em circunstâncias misteriosas e voltam às suas comunidades, perturbam a sociedade cometendo mais crimes e homicídios, como aconteceu recentemente, em Bissau.
Essa situação demostra o desespero gritante e as razões por que o fazem. É uma alternativa para escapar a secura e sobreviver em condições inadequadas. Desumano ou não, essa é a realidade para quem é detido no centro de detenção da Polícia Judiciária, em Bissau.
Essa é a verdadeira ‘telenovela’ dos reclusos que aguardam a tramitação dos seus processos, mas que pela inoperância e a morosidade da justiça guineense, acabam por se transformar em criminosos julgados e a cumprirem as penas antecipadamente, sem nunca serem presentes à justiça ou ouvidos por um juiz de instrução criminal, violando gravemente todo um conjunto de regras emanadas pelas leis internacionais sobre o tratamento de presos.
Uma situação adicional: há menores detidos na mesma cela com pessoas adultas, perigosas e acusadas de crime de sangue, disse a’O Democrata um entrevistado, que também denunciou a falta de comida, que é da responsabilidade do Estado.
O nosso entrevistado refere ainda que essa situação (a falta de comida) tem provocado, com frequência, brigas entre reclusos nas celas.
SUPERLOTAÇÃO DE CELAS – MISTURA DE RECLUSOS DE CRIMES DE SANGUE E MENORES
No Centro, num espaço de pouco mais de 30 metros quadrados, chega-se a ter um número de 40 a 90 detidos, sem camas e nem colchões. Na realidade, a lei prevê 2,5 metros quadrados por detido.
Relativamente às celas, a situação é de total precariedade e longe de ser ultrapassada, sublinha a nossa fonte. Além disso, avançou a mesma fonte, o centro carece de medidas urgentes para garantir o cumprimento dos prazos legais de detenção e da prisão preventiva, de medidas para assegurar o apoio jurídico aos reclusos e melhorar as condições de vida dos reclusos.
Segundo os diretos fundamentais consagrados na lei e os padrões internacionais mínimos exigidos para o tratamento dos reclusos, a Guiné-Bissau está longe de começar a respeitar os direitos de reclusos, facto que na visão do entrevistado de O Democrata testemunha as “péssimas condições” em que os encarcerados vivem no centro.
“Não há separação de reclusos. As crianças menores de 16 anos com problemas com a lei são colocadas em celas com adultos considerados altamente perigosos e acusados de crime de sangue, apesar de a legislação penitenciária nacional não prever isso”, explica. A lei prevê que se criem centros de acolhimento ou de correção. Desta forma, são necessárias ações seja ao nível legislativo para preencher as lacunas existentes, como a construção de institutos educacionais de apoio à reinserção social de menores.
O nosso entrevistado adiantou ainda que os menores acabam por serem vítimas de vários tipos de torturas, abusos sexuais, violações e influenciados negativamente pelos presos mais velhos.
Outra situação de violação dos direitos humanos que ocorre nos centros de detenção e estabelecimentos prisionais e que não escaparam à observação do nosso interlocutor tem a ver com a situação de reclusas que, em certas circunstâncias, sofrem assedio sexual em troca de pequenos favores. Por vezes são mesmo violadas.
Quanto às condições higiênicas no centro de detenção da PJ, o jornal apurou de uma fonte que não há serviços médicos. O mais caricato é que não são feitos exames médicos periódicos na admissão dos reclusos. Praticamente não existe nada. O cheiro a suor é insuportável e ar puro é um sonho. A situação é dramática.
As celas não têm redes para impedir a entrada de mosquitos, insetos responsáveis pelo paludismo. Na época das chuvas, o lugar fica totalmente húmido e impróprio para abrigar pessoas. Uma situação que representa um risco para a saúde dos detidos. É frequente vermos detidos com tosse aguda num espaço fechado e superlotado.
Comparativamente ao interior, em Mansoa e Bafatá, a situação é substancialmente melhor, mesmo assim não é desejável. Por exemplo, um prisioneiro deveria ter comida adequada a sua saúde.
Bafatá dava uma refeição por dia e Mansoa duas. O projeto de panificação, segundo informações, pensado para permitir que próprios os detidos produzam pães, não só para sua alimentação, mas também para venda e assim poderem comprar farinha e outros produtos alimentícios, está parado em Mansoa. Informações indicam que o panificador responsável está doente, por isso o projeto de panificação está parado, informou uma fonte próxima do centro prisional de Mansoa. Em Bafatá, o projeto funciona normalmente.
POPULAÇÃO PRISIONAL NÃO CHEGA AO CONHECIMENTO DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
Relativamente aos estabelecimentos prisionais da responsabilidade do Ministério da Justiça, o nosso interlocutor destacou que o Ministério conhece apenas as prisões de Mansoa (a norte da Guiné-Bissau), Bafatá (leste do país) e o Centro Prisional da PJ. Sublinhou que as esquadras e comissariados da Polícia da Ordem Pública no interior do país dispõem de celas próprias, mas que o Ministério da Justiça desconhece o número da população prisional detida nesses centros. A título de exemplo, na segunda esquadra, em Bissau, há detidos. Mas, o Ministério da Justiça raramente consegue ter todos os dados estatísticos de quantas pessoas detidas nas celas daquela prisão, muito menos a nível nacional, notou a nossa fonte.
A fonte contactada por O Democrata revelou ainda que a “insuportável situação” das prisões obriga os reclusos a dormirem no chão alternadamente. Isto é, um dorme até uma determinada altura e cede o lugar a outro que, entretanto lhe espera encostado à parede, de pé, e assim sucessivamente, especificou, alertando que nota-se a mesma situação, às vezes, nas celas da segunda esquadra, em Bissau.
“O objetivo da prisão é preparar os reclusos para a sua reinserção social. Mas este não é o caso do Centro de detenção da PJ. Os centros prisionais de Mansoa e Bafatá têm beneficiado de pequenos projetos de formação profissional em diversas áreas”, observou.
Segundo o nosso informante, a única liberdade que uma pessoa perde enquanto prisioneiro é a de movimentação. Deve ter acesso à informação, à educação, inclusive o direito de votar, a não ser que se trate de um caso específico, por exemplo, de um criminoso perigoso acusado de crime de sangue. Quando assim é, o indivíduo pode ser interditado de gozar dessa liberdade. Não obstante essa observação, O Democrata soube que os detidos no centro da PJ não gozam da liberdade de relaxarem e apanhar ar no interior do centro, salvo casos excecionais devidamente autorizados.
“O número de detidos neste momento ascende a 90 pessoas numa sala pequena. Os detidos são torturados de várias formas pelos agentes para obter informações. Esse procedimento é ilegal e vai contra a garantia e liberdades fundamentais dos direitos humanos. Chega-se a ter duas ou mais pessoas fortemente algemadas alegando que são perigosas. É grave”, referiu.
PRISÃO PREVENTIVA DOS ‘ENGAIOLADOS’ ULTRAPASSA O TEMPO PREVISTO PELA LEI E LEVA ATÉ DOIS MESES
O repórter constatou outra questão que preocupa bastante os defensores dos direitos humanos. A prisão preventiva dos “engaiolados” que, segundo a lei, vai de 24 às 48 horas, pode ultrapassar esse tempo considerado normal, antes de o detido ser conduzido às autoridades competentes.
A fonte de O Democrata revelou ainda que este período da prisão preventiva pode durar até dois ou mais meses, até seis meses. Explicou neste particular que a dilatação do tempo da prisão preventiva ocorre quando a polícia criminal entender que a pessoa detida esteja ligada a uma rede, por exemplo, de droga. Daí faz-se de imediato um requerimento ao Ministério Público que autoriza a prisão de seis meses, para a tramitação do processo.
Entretanto, um dos desafios que os agentes da PJ enfrentam na sua missão diária, é, efetivamente, conseguir segurar os reclusos nas celas, devido à falta de condições. O centro carece de condições e os detidos fogem facilmente das celas, o que coloca em grande risco a vida dos agentes. Devido à falta de meios, chega-se a ficar à procura de reclusos, em fuga, uma ou mais semanas, revelou a’O Democrata um agente da investigação criminal.
Por: Filomeno Sambú
odemocratagb.com
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