Na visão do Director Geral do Instituto da Biodiversidade e das Áreas Protegidas (IBAP), Alfredo Simão da Silva, o ecossistema de que o país dispõe, para além de mangais (tarrafes), o resto não tem capacidade de adaptação a uma inundação permanente.
“Se o nível de água do mar aumentar, o resto da floresta que temos, ou seja, florestas que não conseguem viver na água, corre sérios riscos de desaparecer. Certamente, poderá aparecer posteriormente outro tipo de floresta resistente à água que possa crescer na zona, mas que não terá o mesmo valor comercial como o atual ecossistema da Guiné-Bissau. A fauna e as espécies desaparecerão”, alerta o Geógrafo que dirige o IBAP.
As alterações climáticas poderão acabar com as espécies nacionais, dando origem a outro tipo de peixes, diferentes dos que dispomos atualmente. Os produtos florestais também desaparecerão, a terra para agricultura desaparecerá e todo o serviço ecossistémico vai desaparecer. No entender de Alfredo da Silva, tudo isso constitui o principal problema da Guiné-Bissau, caso seja afetada pelas mudanças climáticas.
Essas mudanças irão mexer directamente com a vida das comunidades, da população guineense em geral e com a biodiversidade nacional. Por isso, Alfredo Simão da Silva aconselha os guineenses no sentido de se esforçarem e começarem a fazer algumas correcções, mesmo não chegando a fase crítica das alterações ambientais. Temos de adoptar medidas com vista a evitar o pior.
Alfredo da Silva apontou alguns sinais visíveis de mudanças nos arredores da capital Bissau. Por exemplo, a estrada de Sacor, que atualmente em períodos de cheias, é galgada pelas águas do Rio Geba. A estrada de Coqueiro não foge a regra. Muitas outras vias da volta da capital estão com indícios de alterações climáticas.
O culpado das alterações climáticas que ameaçam o povo da Guiné-Bissau é o mau comportamento do homem, no uso irracional dos recursos naturais. A construção de armazéns e outras infraestruturas impede a água de seguir livremente seu curso normal para o mar, criando inundações.
A Guiné-Bissau não era um país inundado, assim como a sua capital, mas as construções de habitações nas zonas húmidas, no caminho de rios e de correntes de água, na zona dos mangais, toda essa má gestão do espaço traz as mudanças climáticas, melhor dito, mudanças negativas na dinâmica da natureza. Isso poderá criar enormes problemas ao país, daí toda a necessidade de trabalhar com intuito de mudar o rumo das coisas com políticas voltadas para a proteção do ambiente.
A dinâmica negativa do ambiente devido aos maus comportamentos humanos está visível na Guiné-Bissau. Outro exemplo, a vila de Varela, no Norte do país, onde a erosão está patente. A cada ano que passa o mar ganha terreno e a terra desaparece.
VARELA E BUBAQUE ESPELHAM A EROSÃO NA GUINÉ-BISSAU
Algumas infraestruturas construídas na zona costeira de Varela foram consumidas pela água do Oceano Atlântico. Atém disso, mesmo a plantação de eucaliptos com vista a estancar o desgaste da terra também já está a sofrer da erosão extremamente forte.
A erosão de Varela tem a ver com o próprio homem, devido à falta de uma boa política de planificação costeira. Na opinião do Geógrafo Alfredo Simão da Silva, a construção do estabelecimento hoteleiro que não chegou a ser concluída na vila de Varela foi mal concebida, precipitando a erosão do mar e acelerando a erosão da terra. Reiterou ainda que a terra está a desaparecer e o chão também, incluindo a plantação de eucaliptos que visa a protecção da costa de Varela está praticamente dentro da água.
Na zona costeira insular do país, a Ilha de Bubaque sofre forte erosão. A localidade onde se situa o Hotel Instância tem os dias contados, segundo as explicações do geógrafo guineense. A Ilha de Maio que apresenta pequenas erosões e as outras ilhas não são imunes as alterações climáticas. Em alguns casos, a intervenção errada dos homens na natureza está na base, por exemplo, da subida do nível da água do mar causado pelo corte desenfreado dos mangais pelos homens para fumar pescado, levando às cheias nas bolanhas, facto visível no Djiu [ilhéu] de Porco.
“Há outra questão ligada às mudanças climáticas, tangente à cheia. Isto é, a subida do nível das águas do mar que danificou os diques em algumas ilhas, em consequência das quais muitas bolanhas foram inundadas. Por exemplo, no Djiu de Porco, a semelhança das outras ilhas, os pescadores cortaram os tarrafesdemasiadamente para secar o pescado, originando o desaparecimento de algumas delas”, revela Simão da Silva.
Todo o mau comportamento humano na natureza pode ter como consequência as alterações climáticas, o que provocará a subida do nível das águas, o desaparecimento das espécies e a extinção do próprio homem!
“A maior consequência da inundação é o desaparecimento do ser humano, porque não estamos habituados a viver numa zona inundada. Quando a zona onde vivemos ficar inundada, certamente se não saímos de lá vamos morrer, as casas onde habitamos vão cair, porque não são habitações com estruturas para suportar a água. O exemplo disso são as situações que acontecem nos arredores de Bissau quando chove muito, porque as pessoas constroem nas zonas húmida, dentro da água”, frisou da Silva.
Quase toda a zona húmida da capital, Bissau está lotada de construções de habitações que agora estão a provocar problemas.
COP22 – COMO BOLÃO DE OXIGÉNIO PARA O MUNDO
Vinte e um (21) anos depois, quase vinte e dois (22), o mundo poderá iniciar um novo ciclo relativamente às mudanças climáticas, caso as partes zelem pela implementação do ‘Acordo de Paris 2015’ sobre a redução em dois por cento (2%) da emissão de carbono, rebaixando em dois por cento a temperatura do mundo. Cerca de duzentos países estarão em Marraquexe, Marrocos, para tentar pôr na prática o compromisso assumido na capital francesa.
O mundo assinou um acordo histórico na vigésima primeira (21ª) Conferência das Partes sobre o Clima (COP21) em Paris, França em Dezembro de 2015, e mais tarde muitos países ratificaram o mesmo documento sobre o clima, em Setembro deste ano [2016] no decurso da Assembleia Geral das Nações Unidas.
Agora, no mês em curso em Marrocos, as partes irão discutir os moldes de implementar o compromisso que assumiram em Paris, que até aqui está a ser difícil de implementar pelas partes.
GUINÉ-BISSAU LEVA A SUA CONTRIBUIÇÃO À COP22
A Guiné-Bissau leva na bagagem à COP22 a sua contribuição relativa à implementação do ‘Acordo de Paris’ no mundo, na África Ocidental e na Guiné-Bissau em particular. O país será representado por uma forte delegação de técnicos ligados aos diferentes domínios ambientais. Há já um grupo avançado de técnicos que se encontra em Marraquexe para os trabalhos preliminares da conferência, depois os peritos nacionais em ambiente serão seguidos de uma delegação ministerial.
O Chefe de Estado, José Mário Vaz deverá estar presente na conferência mundial sobre as alterações climáticas que visa obrigar os países a implementarem o documento assinado em Paris, para a redução da temperatura mundial em dois por cento.
Da Silva aponta que a COP22 centrar-se-á mais nos debates sobre a forma de pôr na prática o ‘Acordo de Paris’ – facto que mexerá com algumas economias, porque implicará o fecho de algumas fábricas, salientou que os países como a Guiné-Bissau, que não emitem carbono, não têm problemas, mas os países industrializados como a Inglaterra, os Estados Unidos da América, a França, são os que terão mais problemas. De seguida a China, Rússia, Índia, África de Sul e Brasil – chamados países emergentes que não dispõem de tecnologias de ponta, mas produzem muito e emitem muita temperatura.
“Os emergentes não queriam reduzir, porque para eles seria um travão para desenvolvimento dos seus países. Por seu lado, os países desenvolvidos disseram que se reduzissem, seriam alcançados pelos emergentes, exigindo uma redução conjunta do carbono. Por último, o grupo dos emergentes pediu que os países desenvolvidos colocassem à sua disposição novas tecnologias para substituir as actuais que emitem muito carbono”, explica a forma como fora alcançado acordo em Paris.
GUINÉ-BISSAU DISPÕE DE ESTRATÉGIA NACIONAL SOBRE O CLIMA
A Guiné-Bissau já dispõe de estratégia nacional para fazer face às mudanças climáticas – ‘Plano de Acção Nacional de Adaptação as Mudanças Climáticas’, tendo na forja diferentes directrizes, por exemplo, alguns projectos a implementar rapidamente para pôr cobro as manifestações de alterações climáticas cujos efeitos já são claramente visíveis.
Foram realizadas várias comunicações sobre as mudanças climáticas no país, assim como foi criado um programa nacional sobre as mudanças climáticas. Igualmente existe um projecto de adaptação às mudanças climáticas a nível do interior da Guiné-Bissau, sob os auspícios da Secretaria do Estado do Ambiente, cujo objetivo é atenuar os efeitos negativos da dinâmica da natureza sobre a população. O efeito das alterações climáticas já são visíveis e o seu reflexo vê-se na economia do país, porque podem começar na população, de seguida na economia do país.
“As inundações podem acabar com as bolanhas, as estradas, as habitações, a fauna, a flora, as florestas, outras infraestruturas e demais bens, provocando perdas económicas. Se tudo isso acontecer, o quê da população guineense?”, questionou Alfredo Simão da Silva, acrescentando de seguida que, “vejam só, chovia muito na Guiné-Bissau, mas agora não chove muito durante seis meses e a chuva concentra-se em três meses – Julho, Agosto e Setembro e quando chove, cai com grande intensidade, provocando danos enormes à população. Agora os guineenses são obrigados a adoptar sementes ou variedades de ciclo curto para a agricultura, sementes que adequados ao ciclo atual, para não perder a chuva nos três meses em que chove. Se isso não acontecer, as pessoas passarão fome, além da chuva torrencial a que as comunidades são expostas agora”.
Quando chove torrencialmente, a chuva provoca inundações e danos impressionantes como tem acontecido um pouco por toda a Guiné-Bissau nos últimos anos.
Além do Instituto da Biodiversidade e das Áreas Protegidas (IBAP), existem outras organizações não-governamentais que actuam no domínio da sensibilização sobre as alterações climáticas através das rádios e demais meios adequados para o efeito, tentando consciencializar as pessoas para a preservação do ambiente. As ONG’s como a Tiniguena, Acção para Desenvolvimento (AD), Associações de Base e outras entidades ambientais fazem as suas sensibilizações e educação ambiental, mostrando às comunidades os efeitos negativos que a intervenção irracional do homem tem na vida comunitária, nacional e mundial.
Por exemplo, a ONG Palmerinha em colaboração com o IBAP, tem um programa nas diferentes escolas do país, onde forma professores, de seguida os professores passam os conhecimentos adquiridos aos seus alunos, mesmo assim, da Silva considera que a mudança de mentalidade é um processo paulatino, afiançando que o resultado que se espera é a longo prazo.
As mudanças climáticas constituem uma enorme ameaça ao desaparecimento da biodiversidade. A biodiversidade depende da chuva, mas de uma chuva equilibrada, porque se houver muita chuva a biodiversidade vai desaparecer – não se pode cultivar num solo cheio de água e algumas espécies não conseguem sobreviver num sítio cheio de água, na natureza tudo precisa estar equilibrado!
GUINEENSES VIVEM DA BIODIVERSIDADE
Se cada guineense reflectir bem de manhã e a noite, olhando a sua dieta alimentar, concluirá que a sua vida está intrinsecamente ligada à biodiversidade. Os habitantes das zonas urbanas podem até menosprezar esse facto, porque podem comprar leite, Iogurte, bolacha etc. Podem confundir, mas os habitantes de Boé – berço da independência nacional, Iemberem, Catió, Cancalifa, Pitche e Pirada, sabem mais do que ninguém que têm uma vida abraçada à biodiversidade, desde aquilo que comem, vestem, os medicamentos tradicionais e até a economia que possuem vem da biodiversidade, quase o consumo dos produtos importados é nulo nas referidas comunidades.
Essas tabancas quase sem vias rodoviárias usam a biodiversidade para curar doenças, para comer e para gerar rendimento – caçam os animais, exploram óleo e vinho de palma, exploram mariscos e peixes no rio, quando adoecem vão à mata a procura de medicamento tradicional, o motivo de a Guiné-Bissau tê-la como sua riqueza – A Biodiversidade.
“Por isso, a Guiné-Bissau é considerado país da Biodiversidade, as pessoas percebem a importância da biodiversidade para a sua sobrevivência. Na Mesa Redonda de Bruxelas, a Biodiversidade foi o ponto forte da Guiné-Bissau para mostrar que temos muita coisa boa para oferecer ao mundo”, garante.
A biodiversidade guineense torna o nosso país rico em matérias-primas para quem pretende montar indústrias para transformação de produtos que compõem a biodiversidade nacional. Por exemplo, para transformar em sumo, Iogurte ou em compota: o veludo, fole, mango, goiaba, mandipli, calabaceira, tambarina e demais produtos que dispomos terá um grande rendimento. Para quem pretende investir na pesca, o país tem diferentes tipos de peixe e de boa qualidade.
GUINÉ-BISSAU QUER ALARGAR A SUA ÁREA PROTEGIDA DE 15% PARA 26,3 POR CENTO
A Guiné-Bissau tem uma área protegida estimada em quinze por cento (15%), mas pretende alargá-la para 26,3% – cerca de vinte e sete por cento, para ajudar na manutenção do processo biogénico – para que continuemos a ter recursos florestais, matas e frutas como fole, veludo, faroba, além de ter outra função de manter a segurança alimentar.
No interior das instalações do IBAP, vê-se nas paredes diferentes fotos que ilustram o potencial da biodiversidade nacional com imagens das pessoas que vivem nas áreas potencialmente biodiversificadas, que consomem produtos oriundos da biodiversidade, mas apresentam-se saudáveis e muito bem nutridos. A ilustração é da exposição que o IBAP chama de ‘Áreas Protegidas, Biodiversidade e Segurança Alimentar’.
Tudo isso, leva as pessoas a mudarem as mentalidades, sobretudo os governantes, motivo pelo qual o país alargará a sua área protegida para cerca de vinte e sete por cento, graçasa uma vontade política do Governo.
USO RACIONAL PODE SALVAR A BIODIVERSIDADE GUINEENSE
Para manter o ecossistema da Guiné-Bissau, os guineenses precisam fazer uma gestão racional da natureza, por exemplo, não caçar demasiadamente, porque os animais têm importância, aconselhou Alfredo Simão da Silva, lembrando que para germinarem, algumas plantas têm que passar pelo estômago dos animais, como é o caso de palmeira natural que o país tem.
Os animais e as florestas desempenham um papel fundamental na sociedade. No caso da floresta, se for toda cortada, o mundo não terá lenha, não haverá fole, veludo, mandipli, a medicina tradicional vai acabar bem como o solo para cultivar. Deixará de chover normalmente e no fundo o homem como parte da biodiversidade desaparecerá.
“A população deve fazer um uso racional para deixar a biodiversidade para as gerações vindouras, se colocarmos casa dentro das águas além de cair, os peixes vão fugir. Tudo tem que estar equilibrado. Peço às populações que façam um uso racional daquilo que Deus nos deu. O sol que nos queima, o que faremos com ele se não tiver um sítio para nos abrigarmos? Não devemos vender as nossas florestas por um valor de cem mil francos CFA por contentor de madeira de uma espécie de árvores que leva trinta anos para atingir a sua maturidade. Se acabarmos com a floresta, as mudanças climáticas virão com chuvas torrenciais e sol intenso”, avisa o geógrafo.
A Guiné-Bissau é vista como património mundial da biodiversidade, devido a sua natureza que tem um pouco de tudo que o mundo tanto precisa, seja na água, assim como na terra.
Por: Sene Camará
Foto: O Democrata/IBAP