As pessoas que foram delegados [ou que se auto-delegaram] o poder de administrar a Guiné-Bissau, precisam definir, por uma questão de princípios, o que somos: ou somos um Estado ou uma Tabanca. Das duas, uma!
“Ninguém pode tomar banho com mesma água do mesmo rio, pois, as novas águas correrão sobre ti” (fragmento 88 de Héraclito). Busquei explorar este fragmento heraclitiana para explicar a ambiguidade organizacional que a Guiné Bissau vive e tem vivido. Talvez pudesse existir outro exemplo melhor.
Estes conceitos (tabanca e Estado) sobre as formas organizacionais administrativas de uma comunidade se não forem bem esclarecidos podem confundir, de um lado, àqueles que defendem a refundação do Estado com base nos princípios tradicionais locais (poder de tabanca e régulos) e, de outro lado, àqueles que primam pela afirmação da democracia de acordo com a definição grega e modelo representativo.
Não sou averso ao poder de tabanca, apesar de ter algumas objeções no que tange certos aspectos, e como também tenho em relação à Democracia representativa e sua ditadura de maioria (será quem tem uma maioria de 51% deve governar sozinho?). Os dois formatos são possíveis. Apenas precisa-se determinar o modelo que se julgar adequado ao contexto temporal ou até pode-se fundir os dois.
Durante minha defesa de tcc (trabalho de conclusão de curso), debati com professor Fernando Afonso, então vice-Reitor de Unilab (Universidade da Integração Internacional da lusofonia afro-brasileira), se era procedente utilizar ou não o termo “tabanca”. Não nos convencemo-nos. Mas isto não era aspecto fulcral do meu trabalho [“identidade e ancestralidade na África face a Europa”]. Muitas vezes, faz-se a confusão de dizer que África tem que voltar a sua tradição como forma de escapar do capitalismo selgavem. Como se Europa nunca teve tradição, ou se não tem ainda parte de Europa que recusa a modernidade. Basta mergulharmos em algumas regiões das balcães, os escossses que sempre nos causaram espanto por usarem saias e sempre julgamos ser protôpotipo de mulher, seriam uma justa comparação com os homens da etnia papel da Guiné, mais agueridos à tradição, costumam atravessar panos nos ómbros. Ou seja, às vezes temos visão errada sobre o que chamamos de NOSSA TRADIÇÃO, como se outros não tiveram e tenham tradições. Portanto, convido o leitor a deixar de lado a nossa mente africana de que, tudo que vai mal em ÁFRICA, tem um culpado fora de África, nunca está em África.
Voltando ao fio da conversa, diria que podemos recriar, se se revelar necessário, um modelo de Estado ainda que seja bi-forçado (tradicional e moderno), que case as tradições de tabanca e as regras do Estado na explanação de Montesquieu (executivo, legislativo e judiciário). Não precisamos de acordos para indicar primeiro ministro e nem escancarar porta de PALÁCIO para receber o povo para depois indicar o PM (Primeiro ministro). O Estado que temos superou esta fase desde os antigos gregos e romanos com a criação de Assembleia e eleição de deputados, o povo não precisa ir ao Palcácio, por isso ele indicou deputados. Não se pode suspender a Constituição em detrimento de regras de Tabanca, nós não adotamos este modelo de organização para coisas republicanas. Nós podíamos bem na nossa constituição, acrescentar mais um poder, que é o regulado, se assim achamos conviente.
Assim Charles Louis de Secounda (Montesquieu) saberia que precisamos respeitar os nossos règulos (sarcasmo). Mas o modelo que adotamos é claro e evidente. Não se escolhe PM através de acordum, nem de Conacri e nem de Cacheu, a constituição da República é clara neste quesito. Quero aqui lembrar um dos mais velhos Brocardos do direito normativo “perante a clareza da lei, faz-se desnecessário a sua interpretação”, mas como toda lei tem sua excesão, está não foge a regra, ou seja, podemos interpretar apenas para quem não sabe ler a lei (constituição). Presidente em nome de quê não faz ideia miníma, perdeu uma boa parte do tempo ouvindo gente para tomar uma decisão que a nossa carta magna deixa clara.
Passo a citar a nossa constituição da República sobre DAS REGRAS GERAIS: – São órgãos de soberania o Presidente da República, a Assembleia Nacional Popular, o Governo e os tribunais Cápitulo I artigo 59. Se o presidente quer tomar uma decisão que transpareça algo baseado no consenso popular, tem que consultar estes orgãos, pois, ouvindo ANP (Assembleia nacional popular) estaria através do modelo da democracia representativa (o modelo que escolhemos) conversando com povo.
A constituição da República não pode ser posta de lado para se valer a vontade própria. Não importa se é Joaquim ou Armando, as regras e modelos adotados devem ser respeitados, fossem elas do ESTADO OU DE TABANCA. Eu particularmente não vou engolir o atestado de incompetência que muitos guineenses queriam que engolimos, tiveram que ir até Concari para buscar consenso. Como é que uma Nação pode se descolcar a outra nação para saber quem pode ser PM (Primeiro ministro), quando se tem isso na lei watcha catheu (bem clara). Nós não estamos em guerra, não estamos no Estado de excesão (quando se suspende a constituição), Parece que somos aversos às regras e normas, de facto nós precisamos escolher o que queremos.
Bordieu costumava emprestar jargões economicos para facilitar o seu leitor. Aqui emprestarei um conceito biblico- “Deutronômio” (segunda lei ou novo contrato DT. 18,19) surge nos penteteucos como livro de Moisés, ali está explicitado mensagem de Deus para o seu povo sobre um novo contrato. Nós precisamos fazer o nosso Deutronomio, ou seja, nossa segunda lei, um novo contrato, se as normas e regras que temos não nos satisfaz. Todos os povos têm o direito de se reinventar ou refundar como dizia Helder Vaz (um dos constituintes de 84, dando mão à palmatória). A partir dum novo Deutrônomio nós teriamos a oportunidade de dizer o que queremos, se é viver com as regras de tabanca, ouvir todos para depois dizer quem pode ser ministro, ou se seremos um Estado nos moldes de Montesquieu e escolher o ministro com base no modelo político que adotamos (semi-presidencialista) independente da vontade dos terceiros.
É mister repensar a situação do país e decidir o que queremos de facto. Isto não só os políticos mas toda sociedade guineense em geeral.
Por: Tamilton Gomes Teixeira
Estudante da UNILAB/Brasil