sábado, 29 de agosto de 2015

Reportagem: PORTA-CONTENTORES ENTUPEM AS VIAS DE CIRCUILAÇÃO DA CIDADE DE BISSAU

porta-contentores em Bissau
As portas contentores que circulam diariamente nas vias públicas e nas avenidas da nossa capital continuam a representar não só uma grande ameaça a vida dos citadinos de Bissau, como também a circulação de outras viaturas. A reportagem do semanário “O Democrata” passou nas diferentes artérias do centro da cidade, onde constatou a paragem de portas contentores nas ruas e em algumas artérias, que segundo as populações representa uma ameaça as suas vidas.
 
A circulação diária na avenida dos Combatentes da Liberdade da Pátrica e nas avenidas pelo centro é perturbada pelas portas contentores provocando o engarrafamento e acidentes que até certo ponto podiam ser evitáveis. As portas – contentores que estão parradas no centro da cidade a espera de descarregamento são controladas pelos jovens ajudantes (assistentes dos condutores).
 
A nossa reportagem apurou que os jovens ajudantes fazem ao mesmo tempo o serviço de guarda dos camiões, pelo que são obrigados a permanecer no local todo o tempo, ou seja, até que o camião consiga descarregar. Estes jovem fazem tudo e mais alguma coisa nos locais onde se encontram parados os camiões.
 
Na estrada que liga as Alfandegas à Universidade Lusófona da Guiné e o Estado-Maior General das Forças Armadas existem sempre longas bichas dos atrelados que acabam por interromper circulação de táxis e consequentemente das pessoas que frequentam aquela zona. Também a mesma situação de bicha da porta – contentores se regista na estrada da zona do Instituto da Segurança Social e a Marinha da Guerra Nacional.
 
AJUDANTES VIVEM NA SITUAÇÃO DE PENÚRIA NAS RUAS PARA GUARDAR OS CAMIÕES
 
Um dos motoristas revelou a ”O Democrata” que a situação é de total penúria para os ajudantes que são obrigados a pernoitarem debaixo dos carros enquanto os produtos não forem descarregados.
 
“Para além desta situação, temos um outro problema ligado a higiene e a falta de água potável. Quem não tem dinheiro tem que recorrer a outros meios. Ficamos aqui às vezes três ou quatro dias a espera de descarregamento das nossas mercadorias”, explica.
 
O nosso interlocutor revelou igualmente que no período da noite a história é bem diferente, porque o espaço é transformado num campo de “prostituição gratuita” sem proteção mínima.
 
“Como pode ter reparado não temos casas de banho. Quando não temos alternativa, recorremos ao interior dos contentores para lavar o corpo e à noite defecamos ao ar livre, porque não temos como fazer”, lamenta.
 
Uma outra fonte disse à nossa equipa de reportagem que cada carregamento feito do interior a centro da cidade recebe um valor que ronda cerca de seiscentos mil Francos CFA, dependendo em certas ocasiões das negociações entre as partes.
 
“Comigo isso tem funcionado assim e quando passam três dias sem descarga, o proprietário da mercadoria é obrigado a pagar diariamente cerca de cem mil Francos CFA ao dono da viatura em compensação dos prejuízos. Pois, é através desta soma que nós, os motoristas também sobrevivemos quando há situação de morosidade na descarga a partir do porto”, nota.
 
Para cidadão comum, circular nas vias que dão acesso à Universidade Lusófona, Ministério da Justiça, às Alfandegas, às Nações Unidas e aos Correios da Guiné-Bissau em direção ao mercado central é um autêntico pandemónio, pelo que é urgente que se tome medidas para pôr cobro à situação.
 
JOVEM AJUDANTE: “LAVAMOS CORPO E FAZEMOS A NOSSA NECESSIDADE AQUI NA PRAÇA
 
Um ajudante de camião que carrega contentores da castanha de caju da empresa “ETC-Bissau” e que pediu anonimato, disse a nossa reportagem que o camião em que se encontra a trabalhar leva mais de dez dias parado ao lado do ministério da Economia e Finanças a espera de descarregar o contentor nos portos.
 
“Estamos aqui a desempenhar dupla função. Um, estamos como ajudante do condutor de camião e a outra função é como  guarda do camião, para evitar que os produtos sejam roubados ”, especifica.
 
Explicou ainda que recebem semanalmente um subsídio de cinco mil Francos CFA e que muitas vezes são obrigados a partilharem o mesmo montante com os condutores, tendo uma diferença de mil francos CFA. Isto é, dois mil francos CFA para os motoristas e três mil Francos FCA para os ajudantes.
 
“Este dinheiro que recebemos é para comprar a comida desde o pequeno-almoço, almoço e jantar, ou seja, satisfazer as nossas necessidades básicas. É claro que isso não chega, mas como fazer? É a nossa opção. Escolhemos que queremos ser condutores e é desta forma que estamos a aprender, portanto vamos saber lidar com o que escolhemos. Imagina só, lavamos o corpo e fazemos as nossas necessidades aqui na praça. Apenas procuramos lugares isolados para fazer essas necessidades”, lamentou o jovem ajudante de 21 anos de idade.
 
O jovem ajudante disse que estão consciente dos riscos de saúde que correm, sobretudo em termos da contaminação de paludismo ou outras doenças devido às condições em que dormem sem nenhuma protecção.
 
“Dormimos aqui sem mosquiteiros e às vezes ficamos dois dias seguidos sem tomar banho, sobretudo no período antes da época da chuva. Agora isso não se verifica, porque chove sempre e até porque o acesso a água já é fácil”, contou.
 
A nossa reportagem viu um jovem ajudante a tomar banho entre dois camiões carregados da castanha de caju ao lado do ministério da Economia e Finanças. O jovem explicou a nossa reportagem que tinha terminado de lavar a roupa, pelo que aproveitou para tomar o banho.
 
“No dia anterior não consegui tomar o banho, por isso aproveitei hoje para tirar um pouco de sujidade. Tenho a consciência que não devo assumir esse comportamento, mas tenho ao lado de mim dois camiões que estão – me a proteger para não ser visto pelas pessoas e, por isso decidi tirar a roupa para lavar o corpo.
 
O jovem confessa, no entanto, que para além de aproveitar da protecção das duas viaturas, à noite toda malta lava corpo no mesmo local.
 
Este jovem ajudante disse que durante o período da noite recebem as visitas das jovens raparigas que passam ali para oferecer os seus serviços para quem está interessado. Frisou neste sentido, que os preços avançados pelas jovens raparigas para o acto sexual se estima no valor de 2.500 Francos CFA (dois mil e quinhentos francos cfa), mas negociável até dois mil Francos CFA.
 
PORTOS DE BISSAU TEM DUAS MÁQUINAS PARA DESCARREGAMENTO DE CONTENTORES
 
Uma fonte de portos contactada pela nossa reportagem que pediu anonimato, contou que no momento existe apenas duas máquinas para o descarregamento dos camiões que carregam contentores da castanha de caju.
 
Relativamente ao atraso registado no descarregamento de camiões e que condiciona o estacionamento dos mesmos nas avenidas do centro da cidade, explicou que a morosidade no descarregamento às vezes acontece quando há problemas de avaria nas máquinas disponíveis.
 
“São duas máquinas apenas a operarem. Quando uma tem problema técnico somos obrigados a ficar a espera da outra que está operacional que faça o  descarregamento dos camiões. As duas máquinas trabalham 24 horas sobre 24 horas, por isso registam sempre avarias técnicas. É preciso procurar mais máquinas para facilitar o trabalho do descarregamento dos camiões, porque neste período da campanha da castanha de caju há sempre movimentações para exportação deste produto”, explicou.
 
A fonte avança ainda que as duas empresas de transporte de carga pesada, designadamente a MAERSK LINE e PORT LINE, conseguem trazer para o país os barcos de grande porte que carrega entre 500 a 700 contentores da castanha de caju.
 
VIAÇÃO PROMETE ACABAR COM ESTACIONAMENTO DE PORTA – CONTENTORES NAS RUAS DE BISSAU
 
Em entrevista a ”O Democrata”, Ângelo da Costa, Diretor de Segurança Rodoviária começa por explicar que a presença das viaturas portadoras de contentores nas avenidas do centro da cidade e nas vias públicas acontece com maior incidência no período de campanha de comercialização e exportação da castanha de caju.
 
Segundo Ângelo da Costa, apesar do despacho do Secretário de Estado de Transportes e das Telecomunicações emitido no ano passado que é de proibir a circulação e estacionamento das viaturas porta – contentores ao longo da Avenida, Amílcar Cabral até ao Cais de Pindjiguiti, os atrelados, como são tecnicamente chamados têm provocado uma autêntica invasão nas avenidas no centro da cidade.
 
O responsável pela Segurança Rodoviária lamenta ainda o facto de o Governo ter criado uma comissão interministerial para sanar a situação de atrelados nas avenidas públicas sem solicitar a Direcção-Geral da Viação, para em conjunto accionarem mecanismos necessários, como tem acontecido em 2014.
 
De acordo com Ângelo da Costa, a má condição das estradas e as vias alternativas ainda em obras de construção e reabilitação estão a condicionar os trabalhos da Direcção-geral da Viação, facto que obriga os cargueiros a entrarem pelo eixo principal, Avenida dos Cambatentes da Liberdade da Pátria em direção ao Porto de Bissau, passando pelas vias do centro da cidade de forma descontrolada.
 
“Hoje vemos remorques por todos os lados do centro da cidade e estacionados descontroladamente, durante uma semana a espera do descarregamento. O mais grave de tudo isso é que os motoristas não são encontrados nos locais de estacionamento”, explica.
Como medida, Ângelo da Costa espera ter uma mão dura sobre motoristas e proprietários dos atrelados a partir de 2016, quando as estradas ainda em construção retomarem a sua forma regular, sinalizadas e entregues às autoridades do país.
 
“Acreditamos que a partir do próximo ano não vamos ter esta situação, porque teremos já uma estrada com ligação directa ao Cais de Pindjiguiti. A partir do Guimetal as viaturas terão duas alternativas para chegarem ao porto. Ou por via do cemitério de Antula ou através do Guimetal passando por Alto Bandim em direção ao porto”, justifica.
 
Na opinião de Ângelo da Costas, as viaturas que saem dos países vizinhos trazendo mercadorias passarão, a partir de novas alternativas, a escoarem seus produtos nos armazéns existentes nos arredores da capital para serem depois transportados pelas viaturas de menor porte ao centro da capital.
 
“Tendo esta medida, teremos a situação mais controlada e favorável a uma circulação mais adequada e sem atrelados a circularem na praça pública ”, defende.
 
O Diretor de Segurança Rodoviária esclarece na mesma entrevista que a comissão interministerial criada todos os anos na abertura da acampanha de comercialização da castanha de caju para facilitar a circulação das viaturas que transportam os produtos para cidade, não significa que essas mesmas viaturas estão isentas de inspecção.
 
“É apenas para evitar os estrangulamentos na circulação. Todavia, ninguém está isento de estar munido de um livrete, a carta de condução ou de levar o carro à inspeçao”, refere.
 
Ângelo da Costa acusa igualmente os condutores de estarem a aproveitar de Livre Trânsito como um tudo. Neste particular, revela que na Guiné-Bissau o nível de inspecção é quase nulo e comparável a forma tal como as pessoas fogem do fisco.
 
Este alto funcionário da viação terrestre, critica igualmente a actuação dos motoristas da porta – contentores que diz porta-contentores sem utilizar os pinos (pequenos ferros) para assegurar os quatro cantos do contentor.
 
Por: Filomeno Sambú
julho de 2015