Benjamim Formigo – Jornal de Angola, opinião
O belo trabalho feito por americanos, britânicos e franceses na Líbia está à vista. Não gostavam de Kadhafi porque não se submetia aos jogos das petrolíferas estrangeiras e aos desejos externos.
A tal “Primavera Árabe” serviu às mil maravilhas para uma intervenção dos três países, sob a capa da OTAN, para mal disfarçar a agressão externa, a pretexto de defesa de civis, para intervirem bombardeando as tropas governamentais, impedindo Kadhafi de controlar a situação.
Na altura escrevemos que estavam a quebrar um equilíbrio instável que só Kadhafi conseguira até então gerir.
Kadhafi caiu e foi barbaramente assassinado por um dos grupos defensores dos “valores democráticos” que assaltava o poder com o apoio activo no terreno da aviação dos Estados UNidos, Inglaterra, França e as armas que eles e outros forneciam.
Hoje a Líbia é um Estado falhado, como convinha aos agressores. O petróleo vai para os seus países sem terem de pagar nada. E ainda lucram comn a venda das armas.
A ONU pode fazer as reuniões que quiser em Genebra, estão lá políticos que não governam nem têm influência, agora participam também autoridades locais, mas quem manda: as tribos nem se sentam à mesa, preferindo agir como faziam antes de Kadhafi, combatendo-se umas às outras, ora por interesses tribais, ora em apoio do que parece serem os dois governos existentes no país: o reconhecido internacionalmente e que teve de abandonar a capital Tripoli, e outro autoproclamando governo que se instalou na capital com o apoio de milícias.
Ninguém tem uma solução e as soluções que se imaginam são elucubrações de tecnocratas que nunca puseram os pés na Líbia nem sabem nada de História da região.
Como se isso não chegasse, nestas situações cria-se sempre um vazio de poder de que o chamado “Estado Islâmico do Iraque e do Levante” se tem aproveitado para equilibrar as forças de poder em seu proveito e com isso estabelecer base a partir das quais tentou incursões no Chade.
A organização estabeleceu ligações nos Camarões que estão a tornar o Norte do país um deserto, acabando com a actividade agrícola na região e criando problemas alimentares tanto nos Camarões como nas zonas vizinhas do Norte do Níger, Sul do Chade, pouco se sabendo sobre a RCA.
Contudo, alguns grupos seus afiliados que agem naquela zona estão perigosamente próximos do Boko Haram, que continua imparável na Nigéria. E leva a guerra a toda a região, sobretudo ao Chade e aos Camarões, que estão já a sentir os efeitos da guerra.
As incursões militares das forças governamentais são poucas e sem a intensidade necessária e não dão garantias de protecção às populações aterrorizadas pelas atrocidades quer do Boko Haram, quer do EI (Estado Islâmico).
A União Africana não pode continuar pelo menos aparentemente passiva. Por isso, na cimeira de Adis Abeba, já foi feita uma delcarçação de que são necessárias forças africanas para travar os rebeldes do Boko Haram.
África não pode contar a não ser consigo mesma. Se os dois grupos unem forças, com a infiltração islamista (terrorismo em nome do Islão, não confundir com islâmico) na costa Oriental a prolongar-se até ao Quénia e a situação instável no Sudão e em certa medida na RDC, formam uma tenaz que ameaça abaixo da cintura tropical.
A situação humanitária que já não é boa nas zonas de conflito, particularmente a Norte da cintura tropical, arrisca-se a tornar-se calamitosa. Nas zonas fronteiriças da Nigéria, Níger, Chade e Camarões começa a sentir-se com grande evidência a acção nefasta das investidas do Boko Haram.
Não chega o auxilio humanitário, até porque as populações refugiadas estão em movimento e não existe segurança em parte nenhuma.
A zona estável do Sul tem de tomar a iniciativa, só ela tem condições para levar a União Africana e, por arrasto, a ONU a agir em favor das populações. As forças conjuntas africanas têm uma palavra importante a dizer.