A Procuradoria-Geral da República de Angola reconheceu hoje, em comunicado enviado à Lusa, que os suspeitos da morte de Alves Kamulingue e Isaías Cassule, os dois ex-militares raptados em 2012 quando tentavam organizar uma manifestação antigovernamental, confessaram o homicídio.
Num comunicado de três páginas, a PGR "lamenta (...) confirmar a morte" dos dois ex-militares, hipótese que a própria PGR aliás não descartava num primeiro comunicado sobre o caso, divulgado no passado dia 13.
A morte dos dois ex-militares está na base da subida da tensão política verificada nos últimos dias em Angola, com a realização no dia 23 de manifestações em vários pontos do país, convocadas pelo principal partido da oposição, União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), consideradas previamente ilegais pelas autoridades.
O segundo maior partido da oposição, a coligação eleitoral Convergência Ampla de Salvação de Angola (CASA-CE) associou-se à causa e na sequência de uma colagem de cartazes, também em várias províncias, um seu dirigente viria a ser abatido, em Luanda, por efetivos da Guarda Presidencial, por alegada violação do perímetro do Palácio Presidencial.
O funeral deste dirigente, na passada quarta-feira, voltou a fazer subir a temperatura política, com os participantes na cerimónia a quase confrontarem-se com a polícia, por insistirem em acompanharem o caixão a pé, numa distância de quatro quilómetros, dentro de Luanda.
Na quinta-feira, foi a vez dos deputados das quatro forças políticas da oposição abandonarem os trabalhos do parlamento, em virtude do partido no poder, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) ter inviabilizado a realização de um debate sobre os acontecimentos dos últimos dias.
No comunicado de hoje, a PGR acrescenta estarem em curso a realização de "diligências processuais de reconstituição dos factos e de exames periciais de ADN para a identificação dos restos mortais dos infelizes".
"A PGR solidariza-se com os familiares dos infelizes pela dor e sofrimento causados pelos infaustos acontecimentos", lê-se no documento, que logo a seguir garante que tudo será feito para o "cabal esclarecimento dos factos".
Os dois ex-militares foram raptados na via pública, em Luanda, nos dias 27 e 29 de maio de 2012, quando tentavam organizar uma manifestação de veteranos e desmobilizados contra o Governo de José Eduardo dos Santos.
Mesmo depois do rapto, ex-militares saíram em duas ocasiões à rua, nos dias 07 e 20 de junho de 2012, ambas não autorizadas, com a última a ser dispersada com tiros para o ar e granadas de gás lacrimogéneo.
Dois dias depois do primeiro comunicado da PGR, o chefe do Serviço de Inteligência e de Segurança do Estado (SINSE) de Angola, Sebastião Martins, foi demitido do cargo pelo Presidente José Eduardo dos Santos.
Os motivos da decisão, não revelados, estão relacionados com o alegado envolvimento de agentes do SINSE na presumível morte dos dois ex-militares.
Sebastião Martins acumulou a chefia do SINSE com o cargo de ministro do Interior, para o qual foi nomeado em 2010 e que abandonou em outubro de 2012, por não ter sido reconduzido na formação do novo executivo saído das eleições de agosto de 2012.