Bissau, 17 nov - As 61 crianças que foram intercetadas no sul da Guiné-Bissau e que estariam a ser vítimas de tráfico para a Gâmbia, com o consentimento das famílias, vão ser acompanhadas pelas autoridades.
Segundo Abubacar Sultan, representante em Bissau do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), "a entrega das crianças vai ser feita segundo um termo de responsabilidade", revelou no sábado em conferência de imprensa.
Os pais vão ter que cumprir apresentações periódicas obrigatórias perante as autoridades, com os filhos, durante um prazo a avaliar, para impedir que as voltem a entregar a angariadores.
No caso, tal como noutros no passado, um homem gambiano com o apoio de guineenses, convenceu os residentes de várias aldeias a entregarem as crianças, prometendo educação e boas condições em escolas de estudos religiosos.
"É uma tentativa de tráfico de crianças, de acordo com os padrões internacionais. Foi o que se confirmou pelas averiguações até agora feitas pelas autoridades", num caso igual a outros na Guiné-Bissau em que as crianças acabam por ser levadas para mendigar ou ser exploradas noutras atividades.
Segundos dados da UNICEF e de entidades guineenses, no primeiro semestre deste ano já tinham sido detetadas outras 66 crianças em casos de exploração.
Em 2012 esse número foi de 308 e em 2011 foram detetados 540 casos.
De acordo com os dados, a maioria dos menores explorados são encontrados nas regiões de Gabu e Bafatá (interior).
Para Abubacar Sultan, este último caso em Buba é uma situação de "crueldade e falta de escrúpulos sob todos os ângulos em que se queira pegar no problema" com "violação múltipla de direitos das crianças".
Mostra que o tráfico é um "fenómeno transnacional" que resulta da situação de pobreza e isolamento das famílias, em tabancas (aldeias) criadas no meio de florestas onde não há estradas, nem eletricidade, nem água canalizada ou outro tipo de infraestruturas.
No local, só os telemóveis, roupas e viaturas que vencem caminhos de terra batida distinguem as povoações de terras de há muitos séculos atrás.
"Os pais e líderes das comunidades estão numa situação de vulnerabilidade, logo, são presa fácil para estes predadores. Daí a repugnância deste ato", sublinha o representante da UNICEF na Guiné-Bissau, que defende uma aposta na formação das famílias para evitar que voltem a ser enganadas.
"Há ignorância em relação às normas e à lei", o que facilita o tráfico de menores, num cenário que reflete ainda "a falta de capacidade em criar um sistema de educação local e formal".
E ainda outros problemas, como a ausência de registos de nascimento.
A prevenção "vai merecer atenção nos próximos dias e meses", sublinha Abubacar Sultan.
"Eles enganam a nossa população, por isso faço um apelo aos pais: não queremos uma geração escravizada", acrescenta Francisco Djata, inspetor-geral do Ministério do Interior, aos jornalistas.
Esta facilidade com que se entregam crianças para tráfico "é uma prática secular na Guiné-Bissau", lamenta Maria Inácia Mendes, presidente do Instituto da Mulher e da Criança.
Uma situação agravada pelo facto de a fronteira ser "vulnerável" e ter "muitos caminhos laterais", refere.
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Noticias Ao Minuto/Lusa