[REPORTAGEM] O mercado central da cidade de Gabú (leste da Guiné-Bissau), sede sectorial da região, está atualmente sem água para as necessidades básicas dos utentes e conta apenas com uma casa de banho disponível para acudir milhares de pessoas que frequentam a chamada feira principal, o que complica bastante as condições higiénicas de todas as pessoas que o frequentam.
Os responsáveis da associação dos retalhistas e grossistas encarregaram-se de fazer uma cobrança diária de 25 (vinte e cinco) francos CFA aos utentes, para poder garantir a limpeza da única casa de banho e pagar aos fornecedores de água. 800 (oitocentos litros de água) são garantidos todos os dias pela associação que congrega os comerciantes de Gabú, através da contribuição dos operadores económicos no mercado e o resto do dinheiro entra para um fundo destinado a manutenção de higiene e reparação da latrina, se se justificar.
É normal ver um fluxo enorme de citadinos de Gabú no mercado central que fica ao lado da avenida principal da cidade, sobretudo no período de manhã. Já por volta das 12 às 13 horas, o movimento começa a escassear, e as mulheres que praticam suas atividades comerciais abandonam aos poucos o mercado.
O mercado é exíguo para responder às necessidades de uma população estimada em 81.495 (oitenta um mil quatrocentos noventa e cinco) habitantes pelo Instituto Nacional de Estatísticas (INE) [no senso de 2009]. A prova disso é a dificuldade de circulação com que os clientes e utentes do mercado são confrontados todas as vezes que se deslocam à feira para as habituais compras.
Outro motivo da superlotação é a grande procura que tem, o que origina engarrafamentos na via rodoviária principal, a entrada da cidade. A nossa equipa de reportagem constatou esse fato no terreno.
Mercado central de Gabú está bem segmentado. Cada tipo de produto tem a sua zona específica, facilitando os clientes nas suas compras. Alguns produtos são expostos no chão sob proteção de plásticos, panos ou lonas. Por exemplo, os repórteres viram tomates, beringelas, cenouras, cebolas, couves, mandiocas, malagueta, alface e outros produtos expostos em plásticos estendidos no chão.
O peixe é vendido em mesas improvisadas. A maioria das mulheres opta pelo peixe fumado, devido à falta de frigoríficos para a conservação do pescado fresco. Neste particular, ‘O Democrata’ soube que o ministro das pescas prometeu disponibilizar um frigorífico para o mercado de Gabú.
O talho encontra-se numa situação menos saudável. Foi muito curioso ver jovens magarefes sentados sobre as mesas em cimento e betão armado, onde se deveria expor a carne, mas que foram transformados em cadeiras para os operadores.
Sobre a situação péssima do talho, onde se vende a carne que a população local consome todos os dias, os repórteres tentaram contatar os responsáveis pelo abate e venda de carnes, sem sucesso.
O mercado tem problemas de conservação de produtos alimentares sensíveis ao calor e à temperatura. As regiões do leste da Guiné Bissau são caracterizadas pelas altas temperaturas.
Os utentes do mercado de Gabú, na sua maioria, são mulheres e não deixaram de manifestar as enormes dificuldades com que são confrontados diariamente.
Na altura da realização desta reportagem, o mercado encontrava-se cheio de lixo. De acordo com os utentes, a entidade responsável pela limpeza e remoção de lixo estava há alguns dias sem fazer o seu trabalho, sem dar satisfações à ninguém, motivando descontentamento das mulheres.
“Pagamos a feira todos os dias, mas o Comité do Estado não cumpre com suas obrigações de limpar e retirar o lixo do mercado”, são as palavras ouvidas de várias mulheres.
A escassez de lugares no mercado superlotado fez com que um grupo de mulheres hortaliças montasse os seus negócios à beira de uma rua próxima, mas as mães queixam-se de constantes perturbações da parte dos agentes encarregues das cobranças que lhes exigem que abandonem o sítio, mas acabam sempre por aparecer para cobrar.
COMÉRCIO EM GABÚ: MERCADO VELHO VERSUS NOVO MERCADO
A nossa equipa de reportagem registou opiniões divergentes relativamente à mudança para o novo mercado situado no bairro de ‘Algodão’. Os comerciantes que já se instalaram no novo mercado dizem que os que ficaram no mercado velho recusaram mudar para um lugar mais confortável, por alegada falta de segurança e de espaço para instalar seus negócios.
O mercado de ‘Algodão’ tal como o antigo conta atualmente com uma casa de banho, mas tem água, ao contrário do velho.
O novo mercado tem melhores condições para comercialização dos produtos alimentícios, e dispõe de um talho adequado para a venda de carne. Porém, o maior problema é a falta de comerciantes. Estes ainda resistem no mercado antigo sob pretexto de alguns em como há mais negócio no mercado principal.
Para dar resposta à questão de segurança levantada por alguns comerciantes, a administração setorial decidiu autorizar a concessão de espaços que circundam o mercado aos interessados para alí construírem os seus “boutiques”, garantindo assim maior segurança a parte interior. As referidas construções estão em curso e algumas já concluídas, restando apenas a mudança dos donos para o “Mercado de Algodão”.
O mercado de ‘Algodão’ tem boas condições, mas está vazio em termos de movimento de compra e venda. Mesmo assim, as mulheres que decidiram mudar para lá estão otimistas por verem o mercado começar a ter boa movimentação de negócio.
Mesmo com espaço disponível no mercado novo, algumas mulheres expõem os seus produtos no chão, sobretudo junto ao portão principal.
Contatado pelos repórteres do jornal ‘O Democrata’, a administração local revelou que o mercado novo não estava sob o controlo das autoridades setoriais, mas o problema está ultrapassado e atualmente está nas mãos da administração de Gabú.
De momento, há um volume considerável de construções a serem executadas no novo mercado construído com apoio das Nações Unidas, através da ONU Mulher, indicando que no futuro a nova feira ganhará também a sua vivacidade.
AMADU CASSAMÁ : “NÃO MUDANÇA PARA O NOVO MERCADO DEVE-SE À SUA PRIVATIZAÇÃO”
Amadú Cassamá, presidente da Associação dos Retalhistas e Grossistas dos Mercados da região de Gabú, explicou que nunca os seus associados recusaram mudar para o mercado novo (bairro de Algodão).
Revelou ainda aos repórteres vários aspectos que estiveram na origem da “não mudança” dos comerciantes para o novo mercado. Segundo ele, isso tem a ver com a privatização do referido mercado, à falta de segurança, o estado avançado de degradação das vias de acesso, falta de afluência dos clientes, entre outros.
“A privatização do mercado fez subir o preço de cedência dos cacifos aos comerciantes, na medida em que os preços variavam até 35 mil francos CFA por mês. O preço é muito elevado para nós, por isso é que a maioria prefere continuar neste mercado no centro da cidade e facilita a movimentação de pessoas”, contou.
Explicou ainda que as autoridades sectoriais tinham informado aos comerciantes que aqueles (comerciantes) que tiverem armazéns ou cacifos no antigo mercado não poderiam ter outro espaço no novo mercado.
“Disseram que quem tiver um espaço nesse mercado não pode ter no novo. Mas sabemos que alguém pode ter espaço no mercado que quiser, dependendo das suas possibilidades e cumprindo com as suas obrigações”, defendeu.
“Um comerciante pode ter espaço em qualquer mercado, tanto em Gabú, Bafatá, Bissau, até em Dakar”, observou.
Informou neste particular que o mercado em causa está situado muito longe e de difícil acesso para os clientes. Em sua opinião, o mercado deveria situar-se num sítio de fácil acesso, onde os compradores poderiam chegar com facilidade.
“O troço que liga o mercado ao resto da cidade encontra-se num estado muito avançado de degradação, é intransitável na época das chuvas. Não tinha segurança e verificavam-se várias situações de roubo. Agora está a ser construído um muro de vedação à volta através de cacifos e isso aumentou a segurança. Os comerciantes não precisam de um local bonito, como as outras instituições, mas sim de um local com movimentação e de fácil acesso para os clientes”, precisou.
Sobre a questão de segurança, afirmou que os comerciantes é que pagam ao pessoal da segurança contratados para o efeito, durante o período da noite. Explicado que os comerciantes que possuem cacifos no mercado pagam mensalmente uma soma de 1000 francos CFA, que é usada para pagar os ordenados aos seguranças.
Relativamente à situação da limpeza e de remoção do lixo, Cassamá assegurou que o mercado carece do serviço de limpeza, tendo acrescentado que a entidade responsável pela limpeza no sector não faz o seu trabalho regularmente. Por isso é que os próprios comerciantes são obrigados a limpar os respectivos espaços, diariamente.
Contou que a única coisa que a entidade encarregue deste serviço faz é a recolha de lixo deitado em determinados sítios ao longo do perímetro do mercado. Frisou que aquela entidade podia ajudar a tornar o mercado muito mais limpo e organizado, se cumprisse com os seus deveres.
Revelou por um lado que o mercado principal da cidade não tem água canalizada, razão pela qual o talho se encontra muito sujo e sem as mínimas condições de higiene, facto que constitui muita preocupação da sua parte tendo em conta os riscos de saúde que os consumidores correm.
Lamentou, por outro lado, a falta de frigoríficos para a conservação de peixe e carne que muitas vezes acabam por prejudicar as pessoas que vendem peixe e carne. No entanto, apelou às autoridades do país no sentido de disponibilizar equipamentos para a conservação do pescado e carne, com vista a ajudar os comerciantes a poderem produzir mais.
No concerne às instalações do matadouro que está muito degradado e sem nenhumas condições de higiene, o que na opinião de alguns consumidores interpelados, a única solução é encerrá-lo até que sejam criadas as condições normais para o seu funcionamento.
Sobre o assunto, Amadu Cassamá disse que a falta da água canalizada no matadouro e no mercado constituem o principal entrave para a higiene dos dois espaços.
Cassamá informou ainda que o mercado conta com duas casas de banhos, mas actualmente funciona apenas uma, que no seu entender, não é suficiente para a necessidade de todos os comerciantes e razão pela qual a maioria acaba por regressar até as suas casas se têm alguma necessidade.
Informou que o referido casa de banho está sob a gestão do comité do mercado, criado para o feito e encarregue de cobrar pessoas um valor de 25 francos CFA para o uso da casa de banho. Frisou ainda que as receitas provenientes das cobranças da utilização do mercado servem para a compra da água e alguns produtos de higiene para a sua limpeza e manutenção.
O comité de mercado tem representação de varias nacionalidades como mauritânianos, conakry-guineenses, malianos.
VENDEDORES DE PEIXE QUEIXAM-SE DA FALTA DE FRIGORÍFICO PARA A CONSERVAÇÃO DO PESCADO
Os vendedores de peixe do mercado principal da cidade queixam-se da falta de frigorífico para a conservação do pescado. Segundo os relatos dos vendedores, esta situação prejudica o negócio. Considerando que viajam até Bissau para comprar o pescado, se não o conseguem vender todo no mesmo dia e o que sobra estraga-se.
Joana Cabral, representante de mulheres vendedeiras de peixe no mercado principal, aponta muitas dificuldades que passam diariamente nas suas actividades.
“Saímos de Gabú para comprar peixe em Bissau e pagamos loto para a conservação do peixe. Depois pagamos o transporte do produto até Gabú. O preço é muito elevado. Se não conseguirmos vender todo o peixe no mesmo dia, o que fica estraga-se. Portanto, se assim for, perdemos o dinheiro investido. Pedimos às autoridades regionais e centrais que nos ajudem neste sentido”, observou a vendedeira.
Contou que decidiram ficar no mercado antigo porque não há movimentação no novo e que quando estavam lá não conseguiam vender os seus produtos.
“As vendedeiras do mercado necessitam de apoio para poderem desenvolver as suas actividades comerciais. Precisamos de apoios em crédito para podermos dar mais impulso ao volume dos nossos negócios”, realçou.
Meta Sane, que igualmente exerce actividade da venda de peixe no mesmo mercado, queixou-se da subida do preço do peixe nos grossistas. Segundo avançou aos repórteres, um cartão de 30 kg que custava 25 mil francos CFA passou para 30 à 33 mil francos CFA e o cartão de 25 kg que custava 19 mil francos CFA passou a custar agora 25 mil francos CFA.
UTENTES QUEIXAM-SE DA FALTA DE LIMPEZA E DE ESPAÇO NO MERCADO
Bobó Embaló, uma das vendedeiras que se senta ao lado de um monte do lixo na porta lateral do mercado, contou à nossa reportagem que a Câmara Municipal de Gabú passa dias e dias sem tirar o lixo daquela sítio onde vende legumes.
“Sento-me aqui no chão, tanto na época das chuvas como na época seca, mas sento-me praticamente no lixo, porque a Câmara não tira o lixo, mas cobra-nos todos os dias” sublinhou a retalhista, adiantando que quando não pagam, os fiscais da Câmara prendem-lhes os produtos.
Questionado porque não se mudou para o novo mercado, uma vez que não tem um espaço no antigo, Embaló apontou a falta de movimento e de clientes e a sua localização geográfica como motivos.
Celeste Koumbá é uma horticultora e vendedeira no mercado de Gabú que todos os dias tira legumes da sua horta para vender no mercado municipal.
Koumbá queixa-se da falta de espaço no mercado razão pela qual estende plásticos no chão para expor os seus produtos. “Não temos espaço para colocar os nossos produtos. Ficamos aqui no chão. Mas a Câmara cobra-nos. Às vezes expulsa-nos deste sítio” disse a vendedeira.
Sobre o novo mercado a horticultora assinalou que o volume de venda no mercado novo é muito reduzido pelo que não poderá cobrir as despesas dos estudos e de saúde das crianças e as da alimentação. Daí decidiu vender no mercado velho.
Convidado a falar dos métodos da conservação dos seus produtos, Koumba disse que não têm como conservá-los, por isso tira uma pequena parte para vender.
UTENTES DO NOVO MERCADO APONTAM FALTA DE SEGURANÇA COMO FACTOR DA NÃO OCUPAÇÃO DO MESMO
O representante do Comité do Novo Mercado de Gabú, Aladje Tcherno Djuma, apontou a falta de segurança e de energia eléctrica como factores da não aderência dos comerciantes aquele centro comercial, mas acredita que em breve os comerciantes da região aderirão ao mercado devido à vedação e a algumas construções em curso.
Este responsável avançou ainda que a administração já atribuiu terrenos aos comerciantes no perímetro do mercado e que estes já estão a construir cacifos. De acordo com ele, essas construções servirão de “muro de vedação” do mercado. No entanto, disse acreditar que com a vedação os comerciantes sentir-se-ão seguros.
Na visão do responsável, o novo mercado oferece melhores condições de higiene e infra-estruturais, e possui também água canalizada, o que permite que o talho esteja todos os dias limpo.
Em relação à instalação da corrente eléctrica, informou que os responsáveis do mercado e as autoridades regionais estão a estudar um mecanismo para pôr cobro à situação. Contou que na cidade há entidades privadas que fornecem energia eléctrica e que estão a negociar a possibilidade de tomar a corrente eléctrica a partir de uma delas.
Tcherno Djuma disse que o mercado possui uma casa de banho que oferece boas condições de higiene, mas também estão a pensar em aumentar mais casas de banho de acordo com as necessidades.
O responsável do Comité do Mercado reconheceu a falta de movimentação, situação que considerou como uma das dificuldades que atravessam de momento, mas segundo ele, tudo vai mudar em breve com as construções que estão em curso.
O comerciante mostrou-se optimista em relação à aderência dos citadinos da região, porque “são os próprios comerciantes que estão a construir os novos cacifos e acredito que esses não vão construir os seus empreendimentos e deixá-los vazios, sem ocupá-los”.
Badjé Baldé, vendedeira no mercado novo, considerou que a “não mudança” dos comerciantes deve-se as questões políticas, porque muitos administradores sentem medo de deslocar os comerciantes, devido as eventuais retaliações contra os seus partidos nas eleições.
“Não houve um administrador que consiga tirar os comerciantes do antigo mercado. Tudo foi misturado com questões políticas, para não serem retaliados nas eleições” notou, para de seguida informar que alguns vendem até na estrada.
Por: Alcene Sidibé/Sene Camará
Enviados especiais à cidade de Gabú