domingo, 21 de janeiro de 2018

Setor de Cacheu: PESCADORES CLAMAM POR FÁBRICA DE GELO PARA A CONSERVAÇÃO DO PESCADO

[REPORTAGEM] O Presidente da Associação dos pescadores e das mulheres vendedeiras do sector de Cacheu (APESCA), Augusto Djata, afirmou que não existe poder de compra no sector e que a quantidade do peixe pescado por dia, em Cacheu, ultrapassa em grande medida, o consumo diário dos citadinos do sector, fato que obriga os pescadores locais a venderem o produto nos diferentes mercados do país.
 
Em termos de conservação do seu pescado, os pescadores dizem que desde a paragem do projeto PESCARTE têm enfrentado enormes dificuldades, sobretudo no que concerne a falta de gelo para a conservação dos seus produtos. A associação conta no momento com 109 membros, entre pescadores e vendedeiras a nível do sector e todos são nacionais.
 
Apesar de tudo, Augusto Djatá lembrou que havia um projeto de pesca “RIA do Sul” financiado pela União Econômica Monetária Oeste Africana (UEMOA) que tinha uma fábrica de gelo de cinco tonelada diárias, mas que agora está parada devido a uma avaria técnica, cuja peça pode ser encontrada apenas no estrangeiro.
 
EMPRESA GARDETE É A ÚNICA QUE FORNECE GELO AOS PESCADORES
 
Nos últimos tempos, os pescadores conseguem conservar o seu pescado graças à empresa Gardete que abastece o setor com um pouco mais de meia tonelada de gelo. Contudo, a associação considera insuficiente esta intervenção para cobrir as necessidades dos pescadores. A empresa Gardete não faz o abastecimento todos os dias, o que quando há o abastecimento, às vezes acaba em pequenas discussões e até brigas entre os pescadores assim como entre as vendedeiras de peixe.
 
O produto resultante da pesca é vendido nos mercados de Gabú, Bambadinca, São Domingos e no Senegal (peixe fumado graças aos “bana-banas”) e o peixe fresco é vendido em Bissau. Para o Senegal, o pescado é comercializado a partir do porto de São Domingos.
 
“Não temos restrições ou limites para praticar a pesca. Tudo depende dos homens de pesca e da capacidade do motor que o pescador tem. Ou seja, se tiver a capacidade do motor que lhe consegue levar ao oceano, pode fazê-lo livremente. Mas os que pescam usando canoas a remo, acabam por limitar as suas atividades apenas ao rio Cacheu”, disse Augusto Djata.
 
Segundo Augusto Djatá, os cacifos que eram geridos pelo Ministério das Pescas na era do PESCARTE passaram à gerência da associação que, por sua vez, distribuiu-os a todos os pescadores membros da organização que lidera a um custo mensal de mil e quinhentos (1.500) francos Cfa cada.
 
No momento da reportagem, a equipa do Jornal “O Democrata” encontrou a associação dos pescadores em atividades de limpeza, no lado esquerdo do Cais da PESCARTE. Também constatou no terreno a divisão feita com redes por uma empresa coreana de pesca que atua no setor, que decidiu separar trigo do milho. Ou seja, de um lado, pode-se ver apenas as canoas propriedade da empresa, e do outro as canoas dos pescadores membros da associação. Com a divisão, os pescadores artesanais de Cacheu passaram a ancorar as suas canoas no limite da maré baixa ou cheia e depois nadam para poder alcançar a terra.
 
EMPRESA SUL-COREANA IMPEDE ELEMENTOS DE ASSOCIAÇÃO DE ATRACAR NO PORTO DE CACHEU
 
O porto de Cacheu era espaço para o desembarque do pescado dos pescadores artesanais. Mas as informações recolhidas no terreno indicam que neste momento perderam esse direito em detrimento da empresa coreana de pesca que decidiu usar a política de delimitação para atracagem das canoas dos pescadores que não fazem parte da empresa.
 
A empresa, por exemplo, usa a filosofia de emprego jovem e emprega jovens. Contrata os proprietários das canoas e pescadores a quem compra o pescado. Segundo informações, a empresa tem pescadores contratados em Cacine (sul do país), Oracan (ilhas do Arquipélago dos Bijagós), bem como noutras zonas do país onde se pratica a pesca artesanal em grande quantidade.
 
Augusto não esconde o seu repúdio em relação à atitude que a empresa coreana assume quanto às dificuldades que os pescadores artesanais local, sobretudo depois da avaria registada na fábrica do gelo “Aria do Sul”, e acusa a empresa de recorrentemente ter negado atender às solicitações da associação no que concerne ao fornecimento de gelo para a conservação do seu pescado.
 
“Antes a instalação da empresa, muita coisa foi prometida. Inclusive eu estava numa das reuniões quando queriam instalar-se aqui, mas nada do que prometeram está a ser cumprido, exceto o emprego dado a jovens. Depois de várias tentativas, só hoje disseram-me que vão vender 30 sacos por semana, duas vezes por semana, se não coincidir com dia em que a empresa recebe seu pescado”, revelou, acrescentando que Cacheu conta com três principais portos de pesca nomeadamente: o porto de Morkunda, o da PESCARTE, e o de Ribada. O peixe primeira, por exemplo, é comercializado pelos pescadores a um peço de mil (1000) francos por quilograma. As vendedeiras vendem opescado ao consumidor a mil e quinhentos (1.500) francos.
 
Relativamente à empresa coreana, um funcionário que não quis ser identificado revelou que o salário mensal é pouco relativamente ao trabalho que fazem. Contudo, sublinhou que dada à situação de precariedade da vida da população camponesa e da falta de emprego decidiram que era melhor continuarem e conformarem-se com o que ganham.
 
PESCADORES CONFIRMAM A EXISTÊNCIA DE BOAS RELAÇÕES COM O IBAP QUE HAVIA INICIADO MAL
 
Sobre a relação entre os pescadores e os responsáveis do Parque Natural de Cacheu, Djatá explicou que nos primeiros momentos, a relação entre os pescadores de Cacheu e o Instituto da Biodiversidade das Áreas Protegidas (IBAP), relativamente ao Parque Natural de Cacheu, foi de revolta devido às normas estabelecidas por aquela entidade, mas com o decorrer do tempo, os ânimos que estavam exaltados foram apaziguados e tudo foi compreendido bem.
 
“Estamos dentro de um parque e vivemos nele. Aqui não acontece como nos outros países. Quando se vai fazer um parque, a população é desabitada e deslocada para outro lugar onde pode realizar atividades económicas para sua autossuficiência alimentar. Apesar de tudo, conseguimos lidar bem com a situação, cumprindo as regras estabelecidas pelo IBAP que tem como lema “pesca hoje, pesca amanhã e depois”. Houve uma forte sensibilização relativamente às redes de pesca e pescar com 22 boias centrais. Temos a zona I, que começa de bocana do rio Cacheu até ao rio São Domingos. Zona II começa do primeiro rio de São Domingos até ao rio de São Vicente”, explicou Djata.
 
Este responsável aproveitou a ocasião para lamentar a situação de roubo do pescado de que são vítimas todos os dias. Para Djatá, os jovens são os responsáveis pelos roubos do peixe (bagre, que é uma das espécies mais consumidas e mais pescadas em Cacheu), apesar de existir também grande número de peixe djafal.
 
Informou neste particular que as autoridades policiais já têm conhecimento dos roubos e que de momento estão a trabalhar para descobrir os verdadeiros autores, lamentando, porém, a demora dos trabalhos da polícia.
 
SENEGALESES ‘INVADEM’ O MAR DE CACHEU A PROCURA DE PEIXE QUE DEPOIS VENDEM NO SENEGAL
 
A repórter visitou alguns portos e noutros encontrou um grupo de pescadores senegaleses radicados em Cacheu, exercendo a atividade pesqueira naquela cidade há anos. Na pequena conversa com a repórter, contaram que pescam já há anos, fazem os trabalhos em turnos, permitindo que todos tenham iguais direitos à pesca.
 
Explicaram, no entanto, que os senegaleses que fizeram filhos ou família em Cacheu visitam Senegal uma vez por ano, porque a maior parte do seu pescado é levada por via marítima ao Senegal e comercializado lá. Justificam que a quantidade pescada ultrapassa a capacidade de compra e de consumo da população de Cacheu.
 
As informações apuradas no terreno junto de alguns pescadores indicam que neste momento esse grupo de pescadores senegaleses não consegue pescado em grande quantidade. Confrontado com a situação, alguns supõem que o fato tem a ver com o grande número de pescadores que pescam diariamente no Rio Cacheu. Contudo, revelaram que pescam com as redes malhas de 70 a 60 para apanharem exclusivamente as bicudas e as de 100 a 110, para os barbos.
 
Quando usam as redes ‘Ramas’ pescam quase todo tipo de peixe, quer de grande, quer de meio porte. Com as suas canoas a motor do estilo Nhominca, conseguem pescar até às zonas das ilhas. Todavia, por falta de gelo em grande quantidade para a conservação do pescado, a grande quantidade acaba por estragar-se.
 
Recorde-se que a cidade histórica de Cacheu conta com mais de dois projetos de pesca e neste momento apenas um funciona. A antiga instalação da PESCARTE, projeto do governo, foi atualmente assumida por uma empresa coreana de pesca.
 
Convém sublinhar que a nossa repórter fez contatos várias vezes com os responsáveis de cada um dos projetos, mas infelizmente resultaram em nada. Contudo, a repórter constatou no terreno que nem todos os projetos têm condições necessárias, ou seja, alguns projetos pesqueiros, em Cacheu, funcionam em total precariedade, com a exceção dos coreanos.
 
 
Por: Epifânia Mendonça
Foto: E.M