…o maior
fracasso na implementação da democracia na Guiné-Bissau tem sido a
“fragmentação” propositada dos grupos, instituições e etnias e a
“neutralização” sistemática das frentes políticas do país. Claro, com mais de
40 partidos políticos num universo eleitoral de menos de 700 mil votantes,
ninguém podia esperar a “fortificação” de influências partidárias ou a
convergência de liderança. Ninguém me poderia convencer de que esta diversidade
política e numérica reflecte apenas só o espírito competitivo do tecido
político guineense. (…) Antes pelo contrário, esta “diversidade” reflecte
várias realidades: a desunião, o egocentrismo, o individualismo e a falta do
espírito colaborativo e do compromisso entre os guineenses.
Por Umaro Djau |
umarodjau@gmail.com
O ano de 2014 que agora começa, apesar de todas as incertezas e dúvidas,
apresenta-se como um ano com grandes promessas para o Povo da Guiné-Bissau, com
a realização das eleições legislativas e presidenciais no país. Apesar das
incertezas sobre as consequências eleitorais, o seu cumprimento rigoroso e
cabal irá representar um ponto de partida para a Guiné-Bissau.
E na expectativa de que acontecimentos
do tipo 12 de Abril de 2012 é um sobressalto que pertence ao passado, resta-nos
esperar que, desta vez, o Poder estará nas mãos do Povo, assim como o futuro
político da Guiné-Bissau.
As frases “o poder está nas vossas
mãos”, e “o futuro está nas vossas mãos” apresentam-se como simples, mas
constituem lemas poderosos, cujos objectivos visam criar a confiança, elevar a
auto-estima e ensinar as pessoas a escolher as suas acções, comandar as suas
vidas e aceitar os resultados e as consequências das suas acções, em vez de
culpabilizar algo ou alguém. Sei que se trata de uma visão optimista e até
ingénua, mas também alcançável, na minha perspectiva.
Mas, em primeiro lugar, analisemos o
contexto da Guiné-Bissau e a minha assunção optimista “o poder está nas
vossas mãos”.
Para muitos guineenses esta assunção
parece mais uma realidade virtual que está fora do alcance de uma vasta maioria
da população. Provas disso, conforme argumentam muitos, podem ser encontradas
em todos os lugares: nas aldeias, nas cidades, nos mercados, nos negócios, nos
meios de comunicação sociais, nos órgãos governamentais, nas instituições
civis, sociais e religiosas. E em cada uma dessas instâncias tem havido um
enraizamento da cultura da “impotência” física, psicológica e mental face aos
problemas e aos desafios crónicos do país.
Estranha-me que um país como a
Guiné-Bissau (repleto de quadros e pessoas inteligentes e capazes dentro e fora
do seu território e de uma juventude vibrante) esteja circunscrito à tamanha
“impotência” e ao espírito de “não sermos capazes” de tirar o país da situação
actual!
Em qualquer viagem para a
Guiné-Bissau, somos confrontados com um dos cenários ou um conjunto de práticas
ou hábitos que sempre fizeram falhar o país e desiludir as esperanças do Povo.
E este Povo da Guiné-Bissau, anteriormente conhecido pelas suas fortes
capacidades de luta e de adaptação, aprendeu agora a viver com esta “impotência”
e o espírito de “Djitu Katen”.
E este mesmo Povo vai injuriando os
“culpados” e vai reclamando nos seus encontros de “djumbai”, nas suas reuniões
de bairro ou em pequenos círculos em torno de um café ou uma refeição. Mas,
este mesmo Povo – desgastado pelo espírito de impotência – já não se lembra de
que o Poder absoluto está nas suas mãos. Ao invés de fazer algo para reclamar,
influenciar e alterar os destinos do seu país, o Povo, mas sobretudo a franja
mais influente da vida política e intelectual guineense prefere ignorar a
realidade e, consequentemente, por imposição própria, neutralizar-se. Ainda
assim, cada pessoa individual vai tentando encontrar um papel para si ou
“fabricar” uma razão de continuar a agir da forma como tem tido, ou seja, a aceitação
da aparente realidade.
Baseado nesta minha modesta
observação, diria que o maior fracasso na implementação da democracia na
Guiné-Bissau tem sido a “fragmentação” propositada dos grupos e etnias e a
“neutralização” sistemática das frentes políticas do país. Claro,
com mais de 40 partidos políticos num universo eleitoral de menos de 700 mil
votantes, ninguém podia esperar a “fortificação” de influências partidárias ou
a convergência de liderança. Ninguém me poderia convencer de que esta
diversidade política e numérica reflecte o espírito competitivo do tecido
político guineense.
Esta mesma “fragmentação”
político-partidária durante os 20 anos de democracia (1994-2014) reflecte
várias realidades: a desunião, o egocentrismo, o individualismo e a falta do espírito
colaborativo e do compromisso entre os guineenses. É esta a realidade política
que tem alimentado a prepotência e a arrogância de uns poucos partidos que se
consideram de “detentores” do país e do Povo guineense. Infelizmente, estes
processos de imposição, por um lado, e de rendição voluntária, por outro, têm
acontecido graças à cumplicidade do próprio Povo e, sobretudo, de tantos
partidos “inflacionários” da Guiné-Bissau.
Assim sendo, a Guiné-Bissau tem-se
tornado num “refém” de interesses mesquinhos e obscuros de pessoas, para além
do Povo, que pensam deter o poder e sentir-se na obrigação de o usar em
benefício próprio. Concordando ou não com a minha posição, a Guiné-Bissau tem
sido historicamente “sequestrada” pelos condicionalismos e caprichos internos
de certos partidos e políticos de elites que pensam deter o poder nas suas mãos
à revelia dos interesses superiores do Povo e do País. Leia o artigo completo - gbissau.com