A Escola Básica da Boa Esperança, localizada a cerca 30 quilômetros da capital Bissau, ofecere o ensino básico para crianças e adolescentes. O número de estudantes cresceu de 40 para 400 desde a fundação em 2004.
A Associação Alemã-Guineense comemorou os dez anos da Escola Básica da Boa Esperança, no último domingo (24.08), na cidade de Colônia, na Alemanha. O projeto oferece ensino básico para crianças na região de Biombo, a cerca 30 quilômetros da capital de Guiné-Bissau.
Em dez anos de funcionamento, a quantidade de estudantes na escola cresceu de quarenta para quatrocentos, e a de professores de seis para dezessete. A iniciativa do projeto foi do guineense Carlos Robalo, que reuniu amigos alemães, em 2001, para criar uma organização não governamental (ONG) com o objetivo de financiar a construção de um estabelecimento de ensino em seu país natal.
Segundo Robalo, a ideia surgiu depois da guerra de 1998 na Guiné-Bissau, ao observar as sequelas que afetaram a região de Biombo: “Quando nós fomos lá visitar depois da guerra, vimos crianças nos antigos quartéis, sentadas em cima de pedras, a receberem aulas. Daí, decidimos criar uma associação aqui em Colônia para angariar fundos, a fim de construir esta escola”. Até hoje na localidade não há eletricidade, nem água canalizada e o poço que fornece água potável para os estudantes e para a comunidade local foi contruído pela própria escola.
Arrecadação de fundos para a escola
O projeto é financiado por doações privadas e de várias entidades, e ainda recebe o apoio de voluntários e membros da ONG. Raoul Mörchen, diretor da Associação Alemã-Guineense, diz que atualmente o projeto tem uma estabilidade devido às diversas formas de doações criadas pela instituição. “Hoje, temos uma base fixa de doações, com a qual conseguimos manter a escola, e algumas despesas extras são pagas por eventos especiais”.
As pessoas interessadas em ajudar a financiar o projeto ‘Eine Schule für Bissau’ fazem doações isoladas ou cadastram um débito automático mensal em suas contas bancárias. Entre as opções oferecidas, há também a adoção de um professor, que custa 40 euros mensais, ou de um estudante, um euro por dia.
Além das doações, segundo Mörchen, os estudantes também colaboram com uma mensalidade equivalente a 1,50 euros. Fernando Dafá, professor de português da escola, e pai de quatro estudantes, relata que o valor é menor do que o que precisaria ser pago em transporte para enviar os filhos para estudar nos distritos vizinhos, caso não houvesse escola na localidade.
No evento de comemoração em Colônia, houve apresentações musicais e comida típica guineense
Greves no ensino
Na Escola da Boa Esperanca, os professores são contratados pelo estado, mas recebem também uma ajuda financeira mensal da ONG. Este sistema de subsídio tem garantido que as aulas não sejam interrompidas, mesmo diante das greves frequentes de professores que acontecem nos estabelecimentos de ensino público do país.
Fernando Dafá ressalta a importância da ausência de greves: “Em qualquer outra escola do estado, há a pertubação das greves, e por isso a escola da Boa Esperança é muito importante, pois quando inicia vai até o fim do ano letivo. Tenho um filho que estuda na escola do estado que perdeu muito tempo, e está com quase seis meses de atraso”.
Desde 1991, não houve um ano sem que ocorressem greves em Guiné Bissau. No ano letivo de 2012/2013, os professores paralizaram oito meses em protesto pela falta de pagamento de salários. Segundo o Manifesto do Coletivo de Estudantes das Escolas Públicas da Guiné-Bissau, em 2012 houve, no total, somente um mês e meio de aulas, o que fez com que o governo aprovasse automaticamente todos alunos, sob a justificativa da impossibilidade da reposição de todas as aulas não realizadas.
Integrantes e voluntários da ONG que colaboram com o projeto
Educação na Guiné-Bissau
Segundo dados da Unesco, o analfabetismo atinge 55% dos guineenses e mais de 30% das crianças não freqüentam a escola. Nas áreas rurais, menos de 60% das crianças vão para escola, e nas áreas urbanas, 80%.
Para Patrícia Rosa, do programa de educação da UNICEF em Guiné-Bissau, as dificuldades no país se dão em diversos níveis.“Tem a questão da infra-estrutura, a questão das próprias crianças que não conseguem ter acesso à escola, por várias razões, seja porque não tem escola nas comunidades, ou porque elas estão em um local de difícil acesso. Ou ainda a falta de materiais, ou por não ter o ensino completo, e os estudantes não poderem continuar até o fim do ensino básico, mesmo se quiserem”, especifica.
Entre outras ações, segundo Rosa, é preciso garantir o aumento da porcentagem de financiamento dedicado à educação pelo governo do estado. Atualmente, esse valor é 13% do PIB, enquanto que a orientação da UNESCO é que sejam investidos aos menos 20% do PIB.
Futuro das crianças da Escola da Boa Esperança
Aproximadamente 70% da população está abaixo da linha da pobreza, de acordo com dados de 2010 do Banco Mundial.As estatísticas publicadas pela CIA no ‘The World Factbook’, mostram que a mortalidade infantil no país é a quinta pior do mundo, com 90 mortes a cada mil nascimentos. E a expectativa de vida é de menos de 50 anos.
Neste contexto, uma das preocupações dos membros da Associação Alemã-Guineense são as possibilidades futuras para estes estudantes após concluírem o ensino básico na Escola da Boa Esperança.
Raoul Mörchen, presidente da ONG, lembra que a maioria das empresas locais que são gerenciadas por imigrantes portugueses. A sua esperança é que, a longo prazo, com uma formação educacional melhor, os guineeses possam ter mais acesso a estes empreendimentos: “Nós ficaremos muito contentes se, no futuro, as crianças que nós educamos puderem trabalhar para essas empresas, e até abrir suas próprias”
Para Carlos Robalo, é preciso pensar também sobre o futuro do projeto e a melhoria da educação em Guiné-Bissau, inclusive com maior investimento governamental. “Nós, como associação, não podemos garantir toda a vida essa assistência. Quem sabe, um dia, as pessoas deixam de dar o dinheiro. É preciso que toda a ajuda seja recolhida como uma coisa transitória. Porque tem que chegar o dia em que a Guiné irá tomar conta disso tudo, e que funcione normal. Como guineense, é esta a minha expectativa”.