"A um ritmo destes, este nível de caça aliado à fragmentação
do habitat e à destruição de habitat permite-nos prever que em menos de 10 anos
desapareçam grande parte das populações de primatas", alertou Tânia
Minhós, bióloga portuguesa co-autora de um estudo publicado na revista
Biological Conservation.
O estudo conclui que seis das dez espécies de primatas existentes
na Guiné-Bissau são comercializadas, com uma estimativa mínima de 1.550 animais
vendidos nos mercados urbanos em cada época seca, período que dura cerca de
nove meses.
No entanto, explicou Tânia Minhós em entrevista à Lusa, o número
de animais caçados será muito maior, já que aos mercados urbanos só chega uma
pequena parte, entre 30 e 40%.
A investigadora, do Instituto Gulbenkian de Ciência e do Centro de
administração e Políticas Públicas do ISCSP, diz que todas as populações
estudadas pela sua equipa - de chimpanzés, babuínos e cólobos - "estão
fortemente ameaçadas de extinção".
"Estimei o numero de indivíduos de cólobos e estão entre 200
e 300 indivíduos. Normalmente assume-se a regra, aplicável a todos os
mamíferos, de que abaixo de 500 indivíduos a população não é viavel. (...) Quer
dizer que estas populações vão desaparecer num futuro muito próximo se não se
fizerem esforços muito focados na conservação", disse.
Questionada sobre o que deve ser feito, a investigadora referiu
que "o principal será parar as ameaças a que [as espécies] estão
sujeitas", nomeadamente a caça e a destruição do habitat.
No entanto, a conservação não é um processo fácil na Guiné-Bissau:
"Por muita vontade (...) há toda uma questão monetária", recordou,
afirmando que o Instituto guineense da Biodivesidade e das Áreas Protegidas não
tem fundos para a logística necessária à manutenção das áreas protegidas, como
contratar guardas florestais ou adquirir veículos.
Na sua investigação, os cientistas constataram também que é
difícil identificar as carcaças de primatas que chegam aos mercados urbanos, o
que compromete os esforços de conservação.
Como os cadáveres chegam alterados - é-lhes retirada a pele e são
fumados para aguentarem o transporte - é difícil identificá-los e análises de
ADN realizadas pela equipa de Tânia Minhós e Maria Joana Ferreira da Silva
permitiram concluir que existe uma grande taxa de erro na identificação feita pelos
vendedores.
"Vendem gato por lebre. Diziam estar a vender uma determinada
espécie, mas depois a grande maioria pertencia a outra espécie", concluiu
Ferreira da Silva, do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos
Genéticos (CIBIO/InBio) da Universidade do Porto.
Segundo a investigadora, isto tem consequências para a
conservação: "Podemos estar a assumir que existe uma determinada espécie
que é muito caçada e muito vendida nestes mercados, podemos estar a definir
medidas de conservação tendo em conta esta espécie, mas na verdade são outras
espécies as mais vendidas".
A carne de macaco é tradicionalmente consumida em zonas rurais,
para subsistência, mas há atualmente "um comércio organizado", cujo
principal destino são os mercados urbanos em Bissau, relatou Tânia Minhós.
A cientista adiantou que a carne de macaco não é consumida como
refeição principal, "é um consumo de petisco, um 'snack', acompanhado de
bebidas alcoólicas e servido com pão".
Além disso, os cientistas constataram ser "mais um luxo do
que uma refeição", já que tem um preço relativamemte elevado para os
padrões da Guiné Bissau: "Um prato pequeno custa dois a três euros, o que
significa que são pessoas com algum poder económico que têm acesso a este tipo
de carne".FONTE:AQUI