sábado, 5 de março de 2016

JUSTIÇA PRECONCEITUOSA. O QUE SE PASSA COM PORTUGAL?

Resultado de imagem para Justiça preconceituosa. O que se passa com Portugal?Um recente relatório das Nações Unidas afirma que as decisões judiciais em Portugal são marcadas por preconceitos. E os exemplos estão à vista, mais recentemente no julgamento do ex-ministro António Maria Carrilho contra a apresentadora Bárbara Guimarães. Mas há mais.
 
Preconceitos de género, raça, extracto social e idade são alguns exemplos que podemos encontrar na justiça portuguesa. Um trabalhador das obras de origem guineense, por exemplo, foi declarado inocente há mais de cinco anos, mas continua a ter ficha na polícia, como violador.
 
Trata-se de um erro judicial grosseiro, mas também um caso de discriminação e preconceito. Bacar Baldé foi julgado à revelia e condenado a três anos e meio de prisão pela violação de uma menor, pelo tribunal de Vila Nova de Gaia. Chegou a cumprir um mês de cadeia e só foi libertado porque os testes de ADN provaram não ter sido ele a cometer o crime.
 
O Estado foi condenado a pagar-lhe uma indemnização, mas Bacar Baldé continua a não ter a sua ficha limpa na polícia.
 
“Cada vez que é interceptado pela polícia, existe uma coisa que é a ficha biográfica e ainda lá aparece como violador. Ou seja, o Estado português já foi condenado e foi reconhecida negligência grosseira, mas a ficha biográfica, como é uma informação policial, continua a ser rotulado como violador”, afirma o seu advogado, Ricardo Serrano Vieira, em declarações ao programa da Renascença “Em Nome da Lei”.
 
O caso Bacar Baldé é, segundo o seu advogado, exemplar da forma discriminatória e preconceituosa como a justiça portuguesa por vezes actua. O valor da indemnização que lhe foi fixado não atendeu às dificuldades em provar danos materiais que teria sempre alguém sem contracto de trabalho ou ordenado fixo.
 
“O cidadão tem meios de rendimento? Tem. Trabalha nas obras, não tem contrato de trabalho, logo não havia meios de prova, viva com a esposa em condições muito precárias, com dois filhos praticamente acabados de nascer, e tudo isto é depois processado pela justiça com as regras que tem, que é: o senhor tem de fazer prova dos danos que invoca. Se fosse uma pessoa com outras responsabilidades e reconhecido na sociedade, certamente que o valor da indemnização seria mais elevado, porque haveria maneira de justificar os chamados danos patrimoniais”, relata Ricardo Serrano Vieira.
Recentemente, a justiça portuguesa foi criticada num relatório das Nações Unidas por ser preconceituosa. Na opinião da professora de Direito Penal Maria Fernanda Palma, tal acontece, não por causa da lei, mas pela má actuação dos juízes.
 
Opinião semelhante tem a socióloga Madalena Duarte, para quem a evolução positiva da lei não tem sido acompanhada pelos magistrados.
 
“A violência doméstica é um excelente exemplo disso. Portugal tem feito, ao nível das transformações legislativas, um caminho que, penso eu, do qual se deve orgulhar e para o qual também contribuíram os movimentos de apoio às vítimas, mas o potencial destas transformações, nomeadamente a alteração do Código Penal em 97 e a lei nº.112/2009, que veio criar o estatuto da vítima e que tem muitas potencialidades, acabam, por vezes, por ficar um pouco capturadas naquilo que é um pensamento mais conservador dos profissionais da justiça, nomeadamente das magistraturas”, afirma.
Conceição Gomes, do Observatório Permanente da Justiça, segue a mesma linha de pensamento e adverte para a discriminação e preconceito ainda existente na própria legislação.
 
“Nas indemnizações por acidentes de trabalho, por exemplo, quando a indemnização é referenciada à capacidade de ganho, é a própria lei que está a dizer que a minha mão, se ganho mais, vale mais do que a de quem ganha menos – ou o pé ou o dedo ou seja o que for”, exemplifica.
 
O preconceito na justiça portuguesa foi o tema deste sábado do programa “Em Nome da Lei”, emitido entre as 12h00 e as 13h00 e que pode ver aqui.