O antigo Primeiro Ministro da Guiné Bissau, Carlos Gomes Júnior, vencedor da primeira volta da eleição presidencial de Abril de 2012 interrompida pelo Golpe de Estado protagonizado por uma Junta Militar liderada pelo general António Indjai, é candidato ao cargo de Chefe de Estado na votação marcada para o próximo dia 16 de Março e garante que nada o demove de ir até ao fim. O ainda presidente do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), que justamente fixou residência na cidade da Praia nos últimos meses, desvaloriza, em entrevista a “O País”, o facto de o partido estar reunido num congresso (que decorre de ontem, Quinta-feira, 30 de Janeiro, a Domingo, 02 de Fevereiro em Cacheu, norte da Guiné Bissau) marcado à revelia e na ausência do seu líder.
Carlos Gomes Júnior, que escreveu esta semana uma carta ao Secretário Geral da ONU pedindo a criação de condições de segurança para se deslocar à Guiné Bissau e participar no acto eleitoral, espera o apoio do PAIGC mas diz que se não a obtiver, irá ponderar mas nunca desistir da candidatura, que poderá tornarse independente. O antigo Primeiro-ministro analisa ainda, nesta entrevista, a situação na Guiné Bissau, nomeadamente a realidade do narcotráfico, que considera ter atingido a dimensão que tem pelo facto de já não ser punido com fuzilamento, pena expurgada da ordem jurídica guineense, lamenta, por pressão da Comunidade Internacional.
Tem um projecto de candidatura presidencial para as eleições marcadas para 16 de Março próximo. Acredita que, nas actuais circunstâncias, irá conseguir levar por diante essa sua pretensão?
Eu ainda sou o Primeiro-ministro legítimo da Guiné Bissau. Fui afastado por um golpe de Estado e tenho responsabilidades a que não posso fugir, devido a essa condição mas, igualmente, pelo facto de eu ser presidente do PAIGC, que é o maior partido da Guiné Bissau e está intimamente ligado à história do país. Em 2012, ganhei a eleição presidencial logo na primeira volta, porque o povo deu um sinal inequívoco e mostrou em quem confiava.
Venci com maioria absoluta, obtendo 52 por cento. Mas com toda a pressão que foi feita à Comissão Nacional de Eleições (CNE), apenas me reconheceram, mais tarde, 49 por cento dos votos. Mesmo assim, com as irregularidades que se registaram e para não criar atritos, patenteei a minha disponibilidade para a ir à segunda volta, mas infelizmente houve o golpe de Estado que interrompeu esse processo eleitoral e estivemos, até hoje, à espera de que se encontrasse uma saída. Como sabe, essas eleições foram reconhecidas como válidas pela própria CNE, o Tribunal Constitucional validou os resultados da votação e a Comunidade Internacional e os observadores foram unânimes em reconhecer que as eleições foram livres, justas e transparentes.
Apesar disso, não se realizou a segunda volta, ninguém se pronunciou, e foram marcadas agora novas eleições gerais de raiz. Por estar certo de que os militantes do PAIGC e o povo da Guiné Bissau saberão qual é o dirigente que merece a sua confiança é que me vou candidatar à Presidência da República. Eu podia dedicar-me tranquilamente à minha vida empresarial, mas pergunto-me se o posso fazer encontrando-se o país no estado caótico em que está.
A resposta é não. Por isso, vou até ao fim e não abdicarei dos meus direitos e nem vou defraudar, tampouco, a confiança que o povo da Guiné Bissau deposita na minha pessoa.
Na carta que escreveu ao Secretário Geral da ONU e a outros altos dirigentes e personalidades internacionais, pede apoios, nomeadamente tendo em vista a garantia da sua segurança pessoal e da dos seus apoiantes. O que espera dessa diligência?
Como tenho dito, o processo eleitoral que se avizinha é de suma importância para o povo da Guiné Bissau porque será o início de algo novo que é possível realizar.
Ao longo do nosso mandato como Primeiro-ministro, conseguimos demonstrar que a Guiné Bissau é um país perfeitamente viável, e o meu Governo deu provas disso, e também da sua capacidade e competência, à Comunidade Internacional. Negociámos e obtivemos, ao abrigo de programas de apoio aos países altamente endividados, o perdão total da dívida externa da Guiné Bissau. Conseguimos sempre pagar atempadamente os salários da Função Pública mas também tomámos medidas impopulares. Por exemplo, fizemos uma coisa que só agora está a ser feita na Europa: baixámos os salários de todos os dirigentes, inclusive o do Presidente da República, para podermos ter margem para aumentar os vencimentos dos médicos, dos enfermeiros e dos professores, etc, promovendo efectivamente a justiça social. Com isso e com outras medidas complementares, conseguimos criar um ambiente propício à motivação dos funcionários e para que as pessoas pudessem trabalhar e mostrar a sua competência.
Acha que o facto de ter mexido em certos privilégios é que terá motivado o Golpe de Estado e tudo o que se seguiu contra si?
Naturalmente! Mas era necessário tomar tais medidas. Num Estado de Direito é necessário fazer reformas, e o Estado deve pagar aquilo que pode pagar e promover a actividade económica com medidas voltadas para quem produz, mas sem descurar os seus próprios interesses. Por exemplo, em 2011, na campanha do caju, que é um dos nossos principais produtos de exportação, conseguimos uma receita extraordinária de 20 milhões de dólares, através de uma taxação de 50 francos CFA por cada quilo. Isso gerou, naturalmente, algum descontentamento, mas a Comunidade Internacional viu que a Guiné Bissau tinha uma equipa governativa séria, competente e capaz de tirar o país do fosso em que se encontrava, não hesitando em tomar as medidas que se impunham. Leia entrevista completa - Opais.net